COSTA GOMES EM HELSÍNQUIA
(1/8/75)
Sr. Presidente:
Permita-me, antes de mais, em nome do meu país, uma saudação a todos os Chefes do Estado e Governo, nesta fase da Conferência de Segurança e Cooperação na Europa.
No início dos trabalhos, mesmo na segunda fase até 25 de Abril de 74, a participação do meu país nas tarefas de cooperação e segurança europeia era ambígua, dado o isolamento político em que Portugal se encontrava.
A nova orientação de Portugal permitiu-nos a integração real dentro do espírito da cooperação. Efectivamente, o lançamento decidido nas tarefas da descolonização, no que representa de cumprimento do direito dos povos à independência, e de democratização, são os nossos pressupostos para uma política de cooperação.
Para o efeito destas coordenadas, dissemos e temos seguido claramente uma política externa baseada tanto no respeito dos nossos anteriores compromissos internacionais como na total abertura a todos os povos do Mundo, com absoluto respeito dos princípios da Igualdade de direitos, não interferência nos assuntos internos e no reconhecimento do direito dos povos a disporem de si próprios.
Esta a nossa política internacional, esses os princípios que explicamos e exigimos nas relações internacionais.
Por isso nos congratulamos por tudo quanto representam as nossas presenças, neste momento, em Helsínquia.
Também aqui se efectuou a primeira fase da Conferência e agora a terceira e última. Todos nós estamos conscientes do que isso representou de esforço para as autoridades finlandesas, cuja eficiência, nos arranjos e facilidades acordados, merece a nossa maior admiração. Uma palavra de profundo apreço ao Governo finlandês.
Seja-me permitido ainda aproveitar a ocasião para agradecer também às autoridades suíças a forma eficiente como organizaram a segunda fase dessa Conferência.
É com confiança e esperança que uso da palavra na Conferência sobre a Segurança e Cooperação na Europa.
Confiança pelo facto de ela constituir um acontecimento ímpar, pois pela primeira vez os Estados europeus, com o Canadá e os Estados Unidos da América, se reuniram animados de uma vontade comum para o reforço da segurança e o desenvolvimento da cooperação na Europa.
A realização em Helsínquia da terceira fase da Conferência sobre Segurança e Cooperação na Europa marca o final de longas negociações, durante as quais os trinta e cinco países participantes se debruçaram sobre um conjunto importante de problemas comuns, alguns dos quais nunca até agora foram objecto de estudo em conferências internacionais. Isso só foi possível pelo desanuviamento progressivo do clima político europeu verificado nos últimos anos.
É a essa luz que devem ser vistas as recomendações que nos são presentes. Os documentos elaborados em Genebra constituem, na verdade, a prova do desejo geral de se aplicarem medidas de carácter prático nos mais diversos domínios de cooperação.
A Conferência elaborou os textos de dez princípios básicos a respeitar e a aplicar nas relações entre os Estados participantes. O alcance e o significado destes princípios não devem passar despercebidos: a igualdade soberana; o não recurso à ameaça ou uso da força; a resolução pacífica dos diferendos a não intervenção nas questões internas; o respeito pelos direitos humanos e liberdades fundamentais; a igualdade de direitos e a autodeterminação dos povos; a cooperação entre os Estados. Todos estes princípios e os restantes formam um conjunto de regras de conduta que deverão ter uma aplicação integral e simultânea. É indubitável que dessa aplicação resultará um reforço da paz e segurança na Europa, contribuindo assim para a paz e segurança no Mundo.
Quanto aos aspectos militares da segurança, a sua importância deriva, sobretudo, do facto de as recomendações apresentadas constituírem ponto de partida importante para a diminuição da tensão política, mediante a instauração de um clima geral de confiança entre os Estados.
Por seu lado, as recomendações tendentes a um estreitamento de cooperação económica poderão constituir uma base para um entendimento mais fecundo e um acréscimo do bem-estar, que dê à Europa e aos seus povos a consciência de que a passagem da confrontação ao diálogo lhes permitirá usufruir de vantagens decorrentes de tal clima. É de acentuar que a Conferência não esqueceu, nos seus trabalhos, os problemas ligados à pessoa humana, alguns dos quais foram, pela primeira vez, objecto de discussão e decisões, num «fórum» internacional. E, nomeadamente, o caso das recomendações respeitantes, a reunificação de famílias, viagens e visitas por motivos familiares, turismo, maior acesso à Informação e melhores condições de trabalho para os jornalistas.
Assim, o desanuviamento não se processará apenas nas relações entre os Estados, mas reflectir-se-á também na vida do homem comum.
Portugal vê com satisfação o relevo dado pela Conferência às relações entre os Estados participantes e os Estados do Mediterrâneo não participantes. O nosso país está intimamente ligado ao Mediterrâneo e tem tradicionais laços de amizade com os povos da região. Por isso mesmo, acolheu com interesse as importantes e construtivas contribuições de alguns países mediterrânicos não participantes. Esperamos que, como resultado da Conferência, como passo importante para o reforço da segurança na área.
A Conferência constitui, sem dúvida, um momento decisivo no processo de desanuviamento na Europa.
No entanto, por mais importantes que sejam os seus resultados, eles não bastarão, por si, para resolver os múltiplos e complexos problemas do nosso continente.
Tem que se aproveitar o clima ora existente, para se prosseguirem os esforços já desenvolvidos. É nesta ordem de ideias que se afigura de particular importância o seguimento a dar à Conferência. Só garantido-o será possível evitar a interrupção dos esforços empreendidos e dispor-se dos meios necessários para continuarem os contactos tendentes a melhorar ainda mais as relações mútuas.
Tal processo dinâmico está, felizmente, garantido mediante as recomendações a esse propósito formuladas.
Disse, ao iniciar a minha declaração, da esperança que me anima neste momento. Ela é partilhada por todo o povo português. E a esperança no futuro da Europa que, livre de conflitos e de divisões, possa cultivar os valores comuns dos seus povos e assegurar-lhes um futuro melhor, num clima de paz e justiça.
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