MEDIDAS CONTRA SOBREOCUPAÇÃO DE CASAS
DECRETO-LEI N.° 232/75, DE 16 DE MAIO
Considerando que o fenómeno da sobreocupação é fruto, além do mais, de uma actividade de sobreexploração e opressão dos moradores, desenvolvida por intermediários sem qualquer justificação no plano jurídico ou moral;
Considerando que o afastamento destes contribuirá decisivamente no sentido da clarificação das relações económico-sociais estabelecidas entre os proprietários e os moradores, sendo condição indispensável da intervenção de fundo que urge empreender no sector da habitação, especialmente a sobreocupada;
Considerando que a sobreocupação reveste uma específica e particular acuidade na cidade do Porto e zonas urbanas dos concelhos limítrofes, atingindo largas centenas de prédios urbanos e envolvendo milhares de moradores;
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pelo n.° 1, 3.°, do artigo 16.° da Lei Constitucional n.° 3/74, de 14 de Maio, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:
ARTIGO 1.º
1. Para os fins do presente diploma, consideram-se casas sobreocupadas todos os prédios urbanos arrendados para habitação cujo índice de ocupação exceda duas pessoas por divisão habitável, excluindo-se cozinhas, instalações sanitárias, arrumos, corredores ou átrios de entrada.
2. Não haverá sobreocupação quando o número de hóspedes não for superior a três ou, no caso de o sublocador viver permanentemente no prédio em causa, deva considerar-se a sublocação como meio de o sublocador amparar a sua economia por deficiência de recursos próprios.
3. Compete à câmara municipal respectiva, após vistoria e a requerimento de moradores interessados, declarar, caso por caso, a existência de sobreocupação.
4. Tal vistoria será realizada no prazo de oito dias, a contar do requerimento, por um perito nomeado pelo presidente da respectiva câmara municipal e na presença, sempre que possível, dos interessados.
5. A realização da vistoria será previamente comunicada aos locador, locatário e requerente, por meio de carta registada.
6. A declaração de sobreocupação, que será passível de recurso administrativo sem efeito suspensivo, será publicada no Diário Municipal ou num dos jornais de maior circulação da localidade no prazo máximo de dez dias após a realização da vistoria, sendo em igual prazo tornada pública através da afixação de editais na câmara municipal e porta da casa a que a declaração se reporte.
ARTIGO 2.°
1. A sublocação de casas sobreocupadas extingue-se por substituição legal ou dos sublocadores pelos sublocatários, que passarão automaticamente a arrendatários directos.
2. A substituição dar-se-á, para todos os efeitos, com e na data da publicação da declaração de sobreocupação, nos termos do n.° 5 do artigo 1.° do presente diploma.
ARTIGO 3.º
1. A hospedagem ou albergaria exercidas em casas sobreocupadas extingue-se por substituição legal do ou dos albergueiros locatários pelos hóspedes, que passarão automaticamente a arrendatários directos,
2. A substituição dar-se-á nos termos do n.° 2 do artigo anterior.
ARTIGO 4.º
1. As substituições legais prescritas nos artigos antecedentes reger-se-ão, além do mais, pelas normas seguintes:
a) A renda global paga ao locador manter-se-á no seu quantitativo anterior, salvo necessidade de arredondamento nos termos da alínea seguinte;
b) Os novos locatários substitutos pagarão rendas parcelares na proporção das sub-rendas anteriormente por si pagas, com arredondamento, se necessário, para a dezena de escudos imediatamente superior;
c) O locador passará recibos de renda separados a cada um dos locatários.
2. Quando o sublocador ou albergueiro substituídos habitarem no mesmo prédio em causa, poderão, se assim o desejarem, passar a meros locatários em perfeita similitude com os demais, comparticipando na renda global na proporção do espaço ocupado.
3. No prazo de quinze dias após se haver operado a substituição, o locador fornecerá a cada um dos locatários uma cópia do contrato de arrendamento por ele celebrado com o locatário substituído.
4. Os locatários substituídos que tenham sido albergueiros têm direito à restituição, no prazo de quinze dias, de todos os bens móveis da sua propriedade eventualmente na posse dos seus antigos hóspedes.
ARTIGO 5.º
É obrigatória a passagem de recibo do preço de albergaria, contendo referência expressa às divisões ocupadas, serviços prestados e seu valor parcelar e período a que respeitem.
ARTIGO 6.°
1. São suspensas sine die todas as acções de despejo, judiciais ou administrativas, com processo comum ou especial, na fase declarativa ou executiva, referentes a casas declaradas em estado de sobreocupação nos termos do artigo 1.° do presente diploma.
2. A suspensão nos termos do número anterior não determina o cumprimento do n.° 2.° do artigo 122.° do Código das Custas Judiciais.
ARTIGO 7.°
1. Constitui crime de especulação, punido com prisão de três dias a dois anos e multa até 50 000$:
a) A sublocação para habitação com sub-rendas que, no seu total, excedam a renda paga ao locador em mais de 20 % desta;
b) A albergaria por preços que, no seu total mensal, deduzido do valor dos serviços prestados com o fornecimento de alimentação e lavagem de roupa, excedam a renda mensal paga pelo albergueiro ao locador em mais de 20% desta;
c) A intervenção lucrativa de qualquer intermediário que imponha a alteração dos termos do ou dos arrendamentos, por forma a aumentar os encargos contratuais dos locatários em mais de 20'% da renda mensal por estes paga.
2. O disposto no número anterior aplica-se também a todas as situações presentes que decorram de contratos celebrados antes da entrada em vigor deste diploma, desde que não sejam regularizadas no prazo máximo de dois meses.
3. Sempre que os locadores tiverem conhecimento das práticas especulativas descritas no n.° 1 deste artigo, serão punidos como encobridores, a menos que delas dêem notícia às autoridades competentes para efeito de procedimento criminal.
ARTIGO 8.º
1. Este diploma aplica-se apenas ao concelho do Porto e freguesias dos concelhos de Vila Nova de Gaia, Gondomar, Maia e Matosinhos,
2. É revogado o Decreto-Lei n.° 6/75, de 7 de Janeiro.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Vasco dos Santos Gonçalves - António Carlos Magalhães Arnão Metelo - Francisco Salgado Zenha - José Augusto Fernandes.
Promulgado em 8 de Maio de 1975.
Publique-se.
O Presidente da República, Francisco da Costa Gomes.