Dossier 25 de Abril.17 de Março

17 DE MARÇO
 
(FOTO: as de "O Século" abrem com o quartel das Caldas)
Reina a ordem em todo o país
Atenções viradas para o jogo entre o Sporting e o Porto, com milhares de adeptos portistas a invadirem a capital. A RTP promete transmissão em diferido. Os jornais trazem notícia da estreia (a crítica será dentro de dias) da "Morte de Um Caixeiro Viajante", de Arthur Miller, no Maria Matos (encenação de Artur Ramos; Paulo Renato, Fernanda Borsatti e Vítor de Sousa estão entre os protagonistas).
Os jornais publicam na primeira página fotos do cerco , no dia anterior, ao quartel da Caldas da Rainha. Uma nota da Direcção-Geral de Informação, DGI, minimiza os acontecimentos, dizendo que abortara "uma rebelião de oficiais subalternos". O último dos seis parágrafos da nota garante: "Reina a ordem em todo o país."
De visita ao Brasil, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Rui Patrício, diz que a sublevação foi "um acto isolado que não obteve eco favorável entre a maioria dos militares portugueses". Mostra-se convicto de que a razão de Portugal acabará por prevalecer: "O tempo está a nosso favor."
Em casa, pela noite fora, Otelo Saraiva de Carvalho bate em "stencil", letra a letra, numa Adler Tippa recém-adquirida, a circular 2/74, que acabara de redigir com Vítor Alves e que colocará em circulação com a data do dia seguinte. Nela o Movimento dos Capitães manifesta "solidariedade activa com os camaradas presos", depois de os qualificar de "generosos e abnegados, sem dúvida, mas excessivamente impacientes". Caíra mal na corporação militar a "intromissão da Pide-DGS" e o facto de ter sido "directamente accionada pelos ministro e subsecretário de Estado do Exército".
Documento
"(...) Não será ousado adiantar que aquela inqualificável manifestação [de generais perante Marcello Caetano, a que se recusaram a comparecer apenas Spínola, Costa Gomes e o almirante Tierno Bagulho] foi a causa imediata dos acontecimentos mais recentes (...).
[A revolta das Caldas] serviu para despertar a consciência de alguns que porventura ainda hesitassem. Serviu para definir com clareza os campos em presença (...). Serviu para revelar, de uma forma brutal, as contradições em que se debate o Exército e - como este é o 'espelho da nação' - a crise geral do país. Serviu enfim para evidenciar os métodos a que recorrem os nossos 'chefes', a sua total ausência de escrúpulos e as alianças a que recorrem para tentar esmagar e paralisar aquilo que já é irreversível. (...) Será porventura ocasião de esperar que o Governo e os 'chefes militares' tenham finalmente encontrado na Legião Portuguesa, na GNR e na DGS [as forças que o regime accionou contra os revoltosos] os valorosos combatentes de que carecem para prosseguir em África a sua política ultramarina?!
Camaradas dos três ramos das Forças Armadas: o episódio da marcha do RI 5 sobre Lisboa, articulado aos acontecimentos que imediatamente o antecederam, permite-nos prosseguir o nosso Movimento com mais segurança e realismo. (...) É necessário mantermos a coesão e reforçarmos as nossas estruturas, conscientes de que, se soubermos ser coerentes e lúcidos, em breve alcançaremos o que nos propusemos.
A bem da nação e das Forças Armadas
A Comissão"
Circular nº 2/74, de 18 de Março