Dossier 25 de Abril.26 de Março

DIA 26 MARÇO
 
FOTO: PRIMEIRA PEDRA NO CENTRO KELLER?
MC SÓCIO DA ANJ
Segredo de vinte anos
É demitido de secretário adjunto da Defesa Nacional o almirante Tierno Bagulho, um dos raros oficiais generais que se recusaram a participar, em 14 deste mês, na manifestação de apoio à política ultramarina de Marcello Caetano. O primeiro- ministro torna-se sócio honorário da Acção Nacional da Juventude. Américo Thomaz coloca a primeira pedra no Centro Helen Keller para crianças invisuais.
A direcção do Instituto Superior de Economia, presidida pelo antigo ministro e deputado Gonçalves de Proença, ordena a ocupação imediata da cerca da escola pela polícia, "a fim de pôr termo aos desacatos [dos estudantes] com eventual identificação dos responsáveis". Nas vésperas do 25 de Abril, em Lisboa, só a Associação de Estudantes de Agronomia se manterá de portas abertas.
Ocupado o Centro Português de Turismo em Bruxelas por manifestantes que apoiam a independência da Guiné. A acção coincide com a abertura de negociações secretíssimas, em Londres, entre um emissário de Marcello Caetano e representantes do PAIGC. Tão secretas que ninguém, nem mesmo Caetano, no exílio, lhes fará referência e só 20 anos depois serão dadas a conhecer, por mérito do jornalista do semanário "Expresso" José Pedro Castanheira (ver texto em baixo).
No Plenário recomeça o julgamento dos réus acusados de pertencerem à ARA. O escritor Carlos Coutinho fala nos motivos que o levaram a aderir ao PCP, o que leva o juiz a interrompê-lo, dando-lhe dez minutos para responder concretamente às perguntas. É marcada para Setembro a data de construção da barragem do Alqueva.
Desapareceram 31 carros em 24 horas na cidade de Lisboa, informa um comunicado da PSP. Os "ratos" manifestam especial preferência por Minis e Datsuns.
"O Governo de Marcello Caetano estava disposto a reconhecer a independência da Guiné e realizou-se em Londres, em Março de 1974, uma reunião nesse sentido. O encontro [entre um representante pessoal do ministro português dos Negócios Estrangeiros e uma delegação do PAIGC] teve lugar nos dias 26 e 27 - a menos de um mês do golpe de Estado do 25 de Abril, mas já depois do lançamento do livro 'Portugal e o Futuro', do general Spínola, e da sublevação do regimento das Caldas.
(...) Rodeado do maior secretismo, o encontro de Londres foi da iniciativa do Ministério britânico dos Negócios Estrangeiros, em colaboração com o Governo da Nigéria. O enviado do Governo de Lisboa foi o então cônsul-geral em Milão, José Manuel Villas-Boas - que é o actual embaixador de Portugal em Moscovo e já foi director-geral dos Negócios Políticos do MNE. O PAIGC, por sua vez, fez-se representar por dois guineenses e um cabo-verdiano. A comitiva era liderada por Vítor Saúde Maria, secretário internacional do partido(...). Acompanhavam-no dois dos mais credenciados diplomatas do PAIGC: Silvino da Luz (...) e Gil Fernandes (...).
Em Londres, Villas-Boas propôs aos representantes da guerrilha um cessar-fogo a curto prazo. Em troca, revelou a disposição do Governo de Lisboa de reconhecer a independência da Guiné (...). Uma das principais dificuldades surgidas durante as negociações foi a falta de resposta do emissário português à exigência do PAIGC de alargar a independência ao arquipélago de Cabo Verde (...). Uma nova sessão foi marcada para os primeiros dias de Maio"...
Cacha do "Expresso", na sua edição de 19/3/94