Dossier 25 de Abril.11 de Abril

11 DE ABRIL
 
NIASSA SIM, FERIDOS NÃO
A história vem em vários jornais. Mas nenhum como o "República" lhe dará tanto relevo, ao colocar em primeira página a fotografia de um homem que, sozinho, construiu uma estrada no lugar de Cadaval, freguesia de Limões, concelho de Ribeira de Pena.
Pensando numa jovem mãe que ainda há dias morreu de parto sem que o subdelegado de Saúde lhe pudesse acudir por "dificuldades de acesso" ao lugar, Firmino Gonçalves Ralo deitou mãos à obra, que a câmara nunca mais se dispunha a executar. Recorreu para isso à "ferramenta que utiliza na lavoura (pás, picaretas, alavancas, maças e guilhos)", não sem antes se ter visto obrigado a tirar as licenças da praxe e se ter sujeitado a uma vistoria do guarda florestal da área que, "mesmo a olho e com passadas largas, mediu o percurso da futura estrada". Perante um novo escolho burocrático - a Câmara autorizava-o a usar dinamite contra o granito desde que fosse ao Porto especializar-se em explosivos -, o camponês, e família, "deu têmpera mais rija à ferramenta" e lá conseguiu rasgar um quilómetro e meio de estrada. Faltam ainda uns quinhentos metros até às primeiras casas do lugar, mas isso é tarefa para depois.
"Segundo nos constou", a Bolsa do Porto irá passar a funcionar diariamente a partir do próximo dia 22, noticia-se num despacho da capital do Norte. "Tal medida deverá pôr termo à denominada 'Bolsa de Sampaio Bruno', verdadeiro mercado a 'céu aberto' de títulos e outros valores que desde há meses funciona naquela artéria central, a que não falta concorrência (e 'mirones') e a cuja artéria, ironicamente, já apelidaram de Wall Street do Porto".
Falta água em Beja. Os serviços municipalizados informam que vão tentar fornecer o "precioso líquido" às partes altas da cidade entre as 10 e as 12 horas e às partes baixas entre as 22 e as 10 horas.
Longamente anunciado como "um dos 10 melhores filmes do ano", já está em exibição o filme "American Graffiti", que o crítico do "Expresso" tem vindo a considerar "o mais belo dos filmes", em contraste absoluto com a redacção do Cinéfilo ("o filme nunca consegue ultrapassar o esboço superficial e inconsequente") e com um dos críticos do "Comércio do Funchal" (CF), que lhe chama ironicamente, "um filme 'importante' pela sua mediocridade".
O "jornal cor-de-rosa" - nome por que é conhecido este semanário madeirense cuja radicalidade atrai sectores mais jovens da oposição - chama os piores nomes ao Teatro da Cornucópia, a propósito do espectáculo "A Ilha dos Escravos" e "A Herança", encenado por Jorge Silva Melo. Numa linguagem de intransigência absoluta, o crítico C. S. acusa a companhia, "dirigida pelos jovens empresários Luís Miguel Cintra e Jorge Silva Melo", de "reaccionarismo de orientação mais marcado ainda" do que o Teatro Nacional. "Já nem a D. Amélia [Rey Colaço, directora e proprietária da companhia que explora, em regime de concessão, o D. Maria] tem a ousadia de 'recuperar' textos hoje tão execráveis e decadentes como os do aristocrático Marivaux, que afinal tanto parecem agradar aos novos jogos de salão da burguesia 'progressista' nacional, a avaliar pelos arrebatamentos da crítica especializada".
Na primeira página da sua edição de hoje, o CF destaca os temas da habitação e do sindicalismo (analisados de um ponto de vista "não reformista") e um dossier sobre S. Tomé e Príncipe.
A convite do professor Marcello Caetano, prossegue a sua visita particular o ex-membro do governo espanhol e amigo do chefe do governo português Lopez Rodó. Hospedado no Buçaco, Rodó tem-se deslocado a centros de interesse histórico e turístico do centro e do interior do país, acompanhado do seu anfitrião, que assim goza também umas curtas férias de Páscoa.
Documento
"Niassa - já se pode dizer que saiu. Notícia pequena. O barco só largou às 23 horas por ter tido necessidade de fazer novas provisões, estragadas pela explosão. Quanto aos nomes dos feridos - NADA! Coronel Saraiva." Telegrama de 11/4/74 da Comissão de Exame Prévio do Porto para o "Jornal de Notícias", in "Os segredos da Censura", de César Príncipe, ed. Caminho