Entrevista com António Reis - Portugal, o marcelismo, as oposições, o Partido Socialista

ERA UMA VEZ UM MILÉNIO

Entrevista com António Reis e Fernando Rosas
“Em tempo de mudança, a História do Século XX”

Por Ricardo Olsen, Rosa Maria, Henrique Soares, Maria dos Anjos Pinheiro e Esmeralda Serrano.
 
 
Portugal, o marcelismo, as oposições, o Partido Socialista. É o tema de hoje como sempre com a participação do professor Fernando Rosas e o convidado o professor António Reis.
“Em Portugal, em 1971, recém-criada, a Intersindical trabalha na clandestinidade. Lisboa assiste à manifestação dos caixeiros e vai sabendo de greves por todo o lado. No país calado pela censura, o ouvido está atento.”
(Luís Filipe Costa)
“Fala Rádio Portugal Livre, aqui Rádio Portugal Livre, a emissora portuguesa ao serviço do povo, da democracia e da independência nacional”
(Palavras da Rádio Portugal Livre)
Fernando Rosas - Muito boa tarde, António Reis, muito obrigado por estar aqui connosco. Vamos hoje falar do movimento socialista. O que era o movimento socialista em 1968 quando Marcelo Caetano é nomeado .primeiro Ministro.
António Reis - Presume-se que pela expressão movimento socialista se entendam as correntes que se reivindicavam do socialismo democrático e da social democracia reformista porque a expressão poderia abranger também núcleos de socialistas independentes que em alguns se consideravam mais à esquerda do que o Partido Comunista, tratando-se portanto do socialismo democrático esse movimento estava consubstanciado numa organização política que era a Acção Socialista Portuguesa, fundada em 1964 por Mário Soares, Tito de Morais e Ramos da Costa.
Fernando Rosas - Existia em 1968?
António Reis - Em 1968 existia duma forma larvar, digamos assim, como a maioria dos movimentos de oposição democrática, com excepção do Partido Comunista e dalguns grupos de extrema esquerda que pretendiam ter uma organização clandestina. Era, evidentemente, um grupo de intelectuais e de profissionais de profissões liberais com pouca implantação ou quase nula implantação no movimento operário, com algumas ligações, apesar de tudo, ao insipiente sindicalismo que ia existindo, mas que se manifestava sobretudo nos momentos eleitorais que a ditadura permitia de quatro em quatro anos e em alguns abaixo assinados conjuntamente com outros sectores da oposição democrática.
Fernando Rosas - Na altura quando o Mário Soares regressa do exílio em São Tomé e, enfim, retoma a sua liderança nesse campo socialista polarizado pela ASP, pela Acção Socialista Portuguesa, dentro da oposição surgem críticas ao movimento socialista por tentar ser uma espécie de interlocutor privilegiado ou preferencial do Regime num eventual processo de transição que o marcelismo anunciava. Acha que, enfim, do ponto de vista agora da serenidade do historiador, acha que essa táctica foi uma táctica da Acção Socialista Portuguesa nessa altura?
António Reis - Há o manifesto publicado pela Acção Socialista ou pelas personalidades ligadas à Acção Socialista, intitulado “À Nação”, precisamente na sequência do regresso de Mário Soares de São Tomé, que, de algum modo, possibilitou essa interpretação através duma frase com uma redacção, algo ambígua, em que os subscritores pretendiam demarcar do chamado socialismo totalitário. Esta demarcação do socialismo totalitário foi interpretada como sendo uma manifestação de tentativa de acordo preferencial entre a ditadura agora presidida por Marcelo Caetano e esse sector da oposição. Por outro lado, algumas personalidades que militavam em torno da Acção Socialista não escondiam alguma expectativa em relação à possibilidade duma abertura liberalizante do Regime.
Fernando Rosas - Uma tentativa, aliás, bastante difundida.
António Reis - Difundida. Eu lembro-me, por exemplo, um editorial de José Ribeiro dos Santos no “Diário de Lisboa”, logo a seguir à tomada de posse de Marcelo Caetano, em que essa expectativa aparecia claramente expressa. Que isso significasse que o socialismo democrático, que o movimento do socialismo democrático, a ASP, particularmente Mário Soares, quisesse arvorar como um interlocutor privilegiado e sobretudo quisesse ser objecto duma legalização preferencial, isso é que me parece ser já uma interpretação abusiva.
Fernando Rosas - No entanto, no entanto o então novo presidente da comissão executiva da União Nacional, Melo e Castro, também se aproximou, preferencialmente, do Dr. Mário Soares nesse campo político como ponto para a oposição.
António Reis - É verdade que houve uma iniciativa desse lado, mas que não teve correspondência do lado do Dr. Mário Soares e da Acção Socialista Portuguesa.
Fernando Rosas - Ele aceitou ir, ele fez...
António Reis - Com exploração de contactos, mas eu creio que Mário Soares e a ASP na altura muito rapidamente se aperceberam de que não estavam criadas condições e sobretudo que havia que provar, na prática e no terreno, as boas intenções liberalizantes e nesse sentido a aposta que foi feita foi relativamente ao acto eleitoral que ia ocorrer em 1969. Foi uma dupla aposta, uma aposta do Regime, por um lado, para se autolegitimar e houve uma aposta do lado da oposição e não apenas na oposição socialista democrática no sentido de testar, no terreno, as boas intenções, as apregoadas intenções liberalizantes do Regime.
Fernando Rosas - De qualquer maneira, nessa altura, aparentemente, a CDE, relativamente à CEUD que é a expressão eleitoral da ASP nessa altura, dá a ideia que mesmo do ponto de vista dum certo campo socialista disponível, católico de esquerda, socialistas de esquerda, etc. a CDE tem uma capacidade de polarização superior à CEUD.
António Reis - Isso é verdade, sobretudo em Lisboa. Não tanto no Porto onde a CEUD concorreu separadamente também em relação à CDE e onde obteve, apesar de tudo, uma votação nas condições evidentemente extremamente discutíveis do tempo e conseguiu uma mobilização que não foi inferior à da CDE. No Porto já aqui se via também a diferente composição do eleitorado do Norte e do eleitorado do Sul, do Porto e de Lisboa, que depois do 25 de Abril permaneceu. De qualquer modo, não há dúvida nenhuma de que na grande Lisboa a mobilização da CDE tinha o apoio dos comunistas, católicos progressistas, socialistas independentes de esquerda foi muito superior àquela que a CEUD obteve na altura, mas atenção que a CEUD também não eram apenas os socialistas democráticos ou os sociais democratas reformistas, para utilizar outra expressão muito usada na época, era também simples liberais ou até monárquicos independentes como o Gonçalo Ribeiro Teles que não deixou de colaborar.
Fernando Rosas - A acção democrato-social, quer dizer, o republicanismo de direita parece nessa altura estar um pouco zangado com o Dr. Mário Soares e com a ASP.
António Reis - Há já uma certa demarcação, é uma geração que está a ser nitidamente ultrapassada pela geração do Dr. Mário Soares, há aqui também uma diferença de gerações para além da diferença ideológica e sobretudo o que me parece ser de realçar nesta altura é que estamos em presença da primeira tentativa de afirmação autónoma duma corrente socialista democrática. Autónoma não apenas em relação à corrente liberal, mas também em relação à corrente comunista que era até então hegemónica na oposição democrática.
Fernando Rosas - E às correntes marxistas-leninistas.
António Reis – Exactamente.
Fernando Rosas - O que é fez com que tu, nessa altura um jovem estudante universitário, o que é que fazia um jovem estudante universitário na fase mais radical da universidade em que o próprio PC parece estar a esvair-se conjunturalmente na luta política da universidade, o que é que faz um jovem estudante universitário aderir ao campo socialista nessa altura.
António Reis - Eu só aderi ao campo socialista reformista democrático depois das eleições de 69. Eu fui militante activo da CDE de Lisboa em 1969, conjuntamente com o Sottomayor Cardia, com Francisco Marcelo Curto e com outros futuros aderentes do Partido Socialista em 1973. Portanto, estávamos próximos como ´compagnons de route´ do Partido Comunista 
Fernando Rosas – Portanto a desilusão vos dá para ir para a direita e não para a esquerda relativamente ao campo onde se encontravam.
António Reis - Eu creio que nós nos, a minha experiência pessoal nesse campo foi determinante porque me apercebi muito rapidamente de que o Partido Comunista tinha uma prática política de controleirismo absoluto e de incapacidade de respeitar uma organização autónoma da oposição democrática na pluralidade das suas correntes. Entre 69, onde eu fui candidato a deputado pelo círculo em que não houve a divisão entre a CDE e a CEUD, foi o círculo de Santarém numa lista que englobava também a Maria Barroso, por exemplo, e 1973 ficou claro que tudo o que era organização do movimento democrático, organização de oposição democrática numa frente unitária tinha de obedecer à estratégia e à táctica do Partido Comunista, difundida através do seu Comité Central e dos seus controleiros. Nessa condições não havia, cheguei rapidamente à conclusão de que era necessário uma alternativa forte, à esquerda, que contrabalançasse essa hegemonia estratégica, táctica, organizativa do Partido Comunista. Para além, evidentemente, progressivamente ter as minhas reservas em relação a uma teoria marxista-leninista ortodoxa que começava a ser fortemente criticada nos meios de esquerda da Europa ocidental, sobretudo a partir do Maio de 68.
Fernando Rosas - Quer dizer, nunca foste atraído pela esquerda radical na universidade.
António Reis - Pelo contrário, sentia-me, considerava essa esquerda radical demasiado utópica e ineficaz num país como Portugal, num contexto histórico e sobretudo era muito sensível às tentativas de renovação interna do marxismo praticada, por exemplo, na área do Partido Comunista Italiano que era, sem dúvida, o mais aberto e heterodoxo dos partidos comunistas da Europa ocidental nessa altura, era um leitor atento de Gramsci e dos seus discípulos do Partido Comunista Italiano e portanto pretendia uma alternativa que era a dum neo-marxismo crítico, heterodoxo que era também partilhada pelos socialistas franceses que pretendiam renovar o Partido Socialista Francês nessa altura. A partir de 1971 o congresso da fundação 
Fernando Rosas - A ASP, em termos políticos, era uma coisa atraente em Portugal para um jovem universitário?
António Reis – Acho que não era atraente de facto para um jovem universitário nessa altura e daí que, em 69, fossem muitos poucos os jovens que tivessem dado o seu concurso à ASP. Alguns como o Jaime Gama ou o Arons de Carvalho, o Mário Mesquita, o José Luís Nunes, mas eram uma minoria no meio do associativismo estudantil e dos dirigentes estudantis da época. Possivelmente isso vai explicar, a meu ver, a necessidade da ASP mais tarde se transformar em Partido Socialista. Essa necessidade deriva do facto de que a ASP, como tal, não captava os meios mais jovens, por um lado, nem captava descontentes do Partido Comunista que já não se reconheciam na ortodoxia do Partido Comunista da época e que procuravam qualquer coisa de novo na área da esquerda.
Fernando Rosas - A entrada dessa geração mais jovem, digamos, na ASP, a sua aproximação traduziu-se nalguma redinamização da organização.
António Reis - Houve alguma redinamização da ASP por essa via, sem dúvida porque a ASP estava entregue a um conjunto de velhos dirigentes, na sua maior parte [Fernando Rosas – Os advogados da Baixa, como se dizia] Os chamados advogados da Baixa. Por outro lado, sobretudo quando o Mário Soares vai para o exílio nota-se claramente a necessidade [Fernando Rosas - Para o segundo exílio] Para o segundo exílio, exactamente, durante o marcelismo, nota-se a necessidade de sangue que permita um maior dinamismo de organização e há tentativas tanto no campo da elaboração programática como no campo organizativo e de extensão sobretudo ao movimento sindical que conhece nessa altura uma renovação importante no sentido de fazer da ASP um organismo com mais raízes
Fernando Rosas - O campo socialista nessa altura ligado à ASP tem dois instrumentos que são relativamente importantes. Adquirem o jornal “República” e a Cooperativa de Estudos e Documentação. Colaboraste nessas iniciativas?
António Reis - Eu na altura estava na “Seara Nova” e a “Seara Nova” era um local, uma revista mensal importante, a mais importante da oposição democrática na altura, em que coexistiam comunistas e socialistas independentes e variados matizes que iam. Pessoas como Marcelo Curto, eu próprio, o Jorge Sampaio, o Andrade Santos, etc. Lopes Cardoso também, o Augusto Abelaira, era director nessa altura, a “Seara Nova” não era portanto um órgão ligado ao movimento socialista democrático reformista da época, mas tinha boas relações apesar com as pessoas que militavam nessa área e justamente a tentativa de transformação de ASP em partido começa com o aliciamento, entre aspas, de pessoas da redacção da “Seara Nova” que estavam nessa corrente socialista independente ou de recentes dissidentes do Partido Comunista como era o caso do Sottomayor Cardia.
Fernando Rosas - Consideras que a ASP, antes da fundação do PS, tem uma linha política clara acerca da forma de derrubar o Regime ou mesmo acerca, por exemplo, de questões como a da guerra colonial.
António Reis - As eleições de 69 representaram aí, a meu ver, um momento de viragem, de transição para a oposição, para uma linha política mais clara nesses domínios.
Fernando Rosas - Quer dizer, alguma coisa que não fosse só estar à espera que o Regime caísse.
António Reis – Por um lado, creio que a ASP era herdeira de toda, em matéria de estratégia de derrube do Regime, sempre foi uma herdeira de toda a tradição republicana e liberal que apostava no “putsch” militar e aí foi coerente até ao fim [Fernando Rosas - Ou da reforma interna] Ou da reforma interna, mas aí seguiu sempre essa linha e nunca acreditou no chamado levantamento nacional e na insurreição popular de massas que o Partido Comunista que era a posição estratégica do Partido Comunista. [Fernando Rosas - Também não acreditava muito] Mas que era constantemente apregoada no jornal “Avante!”, não é. Mas, por outro lado, em relação à guerra colonial a partir das eleições de 69 nota-se, claramente, que e pelos primeiros documentos programáticos da ASP e a seguir o programa do Partido Socialista aposta claramente no reconhecimento, imediato, do direito à autodeterminação e à independência, no estabelecimento do cessar fogo imediato, na base do reconhecimento desse direito, portanto, uma posição que já não divergia da posição também do Partido Comunista e da oposição democrática, em geral.
Fernando Rosas - Isso é uma posição relativamente tardia, não é.
António Reis – Que eu creio que se começa a elaborar a partir dos documentos de 1970 e que tem a sua tradução depois do primeiro programa do Partido Socialista
Fernando Rosas – Mesmo no campo socialista tinha uma certa tradição, é herdeira do republicanismo em termos de 
António Reis – Foi muito prudente neste aspecto. Eu lembro-me de um companheiro meu de lista que estava também na órbita da ASP, um católico Francisco Lima, companheiro de lista das eleições de 69, resolveu editar, ele próprio, à parte, do programa da nossa lista eleitoral em Santarém da oposição, um documento, um opúsculo com a sua própria posição em relação à guerra colonial que advogava uma autonomia progressiva, eleições, referendos, etc.
Fernando Rosas - Porquê criar o Partido Socialista. Vocês no interior, cá dentro, eu percebo bem que do exterior, os elementos ligados à ASP no exterior, as suas ligações com a Internacional Socialista, com os partidos socialistas, uma maior sensibilidade para a situação internacional, percebo que essa ideia de fundar o Partido fosse uma pressão do exterior, importante para uma certa cobertura internacional da acção do Partido, mas no interior, como é que vocês entendiam essa questão de fundar o Partido Socialista.
António Reis - Eu acho que foi sobretudo um acto de clarividência política a prazo, ou seja havia a sensação de que alguma coisa teria de mudar num prazo relativamente curto. Evidentemente nenhum de nós em 73 estava convencido de que o Regime caía no ano seguinte. Pelo contrário, estávamos à espera ainda de passar uns bons anitos na oposição, mas apesar de tudo sentia-se que a situação era insustentável por muito mais tempo e tendo em conta o contexto internacional que se vivia, em que os partidos socialistas estavam a conhecer, sobretudo em França, e no Chile, não esquecer a experiência do Allende no Chile que também funcionou como incentivo para a criação dum partido Socialista entre nós e Soares nessa altura visitou Allende no Chile sentia-se a necessidade de uma alternativa socialista que se demarcasse claramente no seio da oposição do Partido Comunista e que demarcasse também de toda a tradição liberal republicana. Um espaço verdadeiramente autónomo para, na eventualidade da queda do Regime evitar que a oposição aparecesse, no fundo, sob a batuta do Partido Comunista e a seguir de uma miríade de grupos de extrema esquerda. Portanto, era necessário que a esquerda não fosse unicéfala, fosse bicéfala, no mínimo.
Fernando Rosas - Mas porque que é que isso se traduzia na transformação da ASP em Partido Socialista. Eu pergunto isto porque sei que houve divergências, sei que houve gente que entendeu duma maneira diferente
António Reis - É verdade, é verdade. É claro que a ASP não tinha estruturas organizativas nem um conjunto de militantes em número suficiente que à partida justificasse, em termos aceitáveis, a sua transformação em partido político.
Fernando Rosas - Pode-se dizer que havia um órgão directivo no interior da ASP.
António Reis - Havia um órgão directivo reduzido, é certo, que era o secretariado da ASP, mas de facto com pouca actividade e é a partir da transformação da ASP em partido que começa a haver pela primeira vez, digamos, verdadeiramente órgãos directivos a funcionar regularmente. Um secretariado, com uma componente no interior e uma componente no exterior, oito elementos no interior, cinco elementos no exterior, eu fui um dos elementos do interior nessa altura e um conselho directivo com vinte e sete membros e que reuniam com regularidade, nomeadamente o secretariado, reunia praticamente quase todos as semanas. Por outro lado, começa a haver a preocupação de elaborar documentos programáticos, de criar uma rede de apoios a nível nacional que distribuía o “Portugal Socialista” e que distribuía comunicados e que começou logo, a partir de finais de 73, a procurar contactos nas Forças Armadas, aproveitando o facto de até alguns de nós estar a prestar serviço militar nessa altura.
Fernando Rosas - Mas no congresso de fundação do Partido Socialista há uma corrente que se opõe à fundação do Partido.
António Rosas - Há uma corrente que se opõe, mas que se opõe por razões que tinham a ver sobretudo com receio duma vulnerabilidade acrescida do movimento perante a máquina repressiva porque à face da legislação em vigor, uma coisa era a existência dum movimento semi-legal, cívico, com o nome Acção Socialista, outra coisa era assumir, claramente, o estatuto de partido político que nos sujeitava, evidentemente, a consequências mais graves do ponto de vista penal.
Fernando Rosas – E houve, sentiram da parte da polícia algum aumento de pressão repressiva sobre o vosso grupo, sobre o vosso movimento.
António Reis - Bem, eu não serei a fonte mais adequada para responder na medida em que não tinha a experiência anterior da ASP, mas não tenho testemunhos nenhuns que apontem nesse sentido da parte dos meus camaradas da altura, não é. Eu creio que a máquina repressiva continuava preferencialmente orientada para os militantes e dirigentes do Partido Comunista, para os seus próximos companheiros a nível da CDE e para determinados movimentos da extrema esquerda clandestina com actividade.
Direi do meu tempo que havia um S
Havia uma sombra e um silêncio
Havia um S de sigla e de suspeita
Com as suas seitas e seus sicários
Não sei se signo, não sei se sina
Não sei se simplesmente sujo
Ou só servil ou só sevícia
Havia um S de Saturno, havia um susto
Havia um S de soturno sobre um S de sol
Do meu tempo direi que havia um S de sepulcro
Sentinela, sentinelas, ou talvez selva, talvez serpente
S de sede e de semente 
Seco, seco e também senão, e também senil
Do meu tempo direi que havia um S sem sentido
E também Setembro e também solstício
Saga e safra ou talvez semente, talvez segredo 
Havia um S de sal e sílex
Havia um silvo, havia uma sigla ciciada
E também o sonho entre soar e ser
Como um soluço, como um soluço 
Do meu tempo direi que havia um S de sol e sombra
Havia Setembro e um assobio
Contra um S de sombra e de silêncio
(Poema recitado por Manuel Alegre)
Locutora - Com Fernando Rosas e António Reis continuamos na próxima semana. “O marcelismo, as oposições, o Partido Socialista” vai ser novamente o tema.
Fizeram este programa Ricardo Olsen, Maria dos Anjos Pinheiro e Esmeralda Serrano.

(Programa gravado da Antena 2 no dia 10 de Abril de 1998)

2ªParte
 [...]
através da realização de uma vigília de 48 horas sob o tema a paz é possível. Os presentes nessa vigília aprovaram uma moção a condenar a continuação da guerra colonial. Entre os participantes contavam-se, entre outros, Pereira de Moura, Luís Moita, Maria Benedita, Galamba de Oliveira, Nuno Teotónio Pereira, Homero Cardoso e os estudantes liceais Francisco Louçã e Miguel Teotónio Pereira. Na Assembleia Nacional os acontecimentos foram vivamente discutidos. Vamos ficar com o debate entre os deputados Miller Guerra, da ala liberal, e Casal-Ribeiro.
Casal-Ribeiro – O senhor deputado achava bem que se discutisse a presença de Portugal no Ultramar.
Miller Guerra - Ora aí está uma pergunta objectiva e concreta que eu respondo também objectivamente e concretamente. Acho sim senhor. Não só na igreja, mas como qualquer noutra parte.
Casal-Ribeiro - Então não preciso de mais nenhuma resposta de Vossa Excia. Está realmente, politicamente definido para mim, duma vez para sempre.
Miller Guerra - Ainda bem, senhor Casal-Ribeiro, ainda bem senhor almirante, ainda bem senhor almirante.
Casal-Ribeiro - Tristemente definido.
Miller Guerra - Ainda bem. Portanto eu volto um pouco atrás. É aqui, nesta terra glorificada pela fidelidade à igreja que no dia 31 de Dezembro, alguns católicos reunidos numa capela para discutirem a justiça, a paz e a guerra são expulsas do templo por ordem do Governo, presos e como se ainda fosse pouco, e como se fosse pouco demitidos dos seus cargos públicos.
Ainda em 1973, a 17 de Janeiro, através de um decreto-lei, Veiga Simão, Ministro da Educação Nacional, cria a categoria de vigilantes do quadro de pessoal auxiliar dos estabelecimentos oficiais do ensino superior. A 20 de Janeiro, em resultado de uma acção planeada e executada por iniciativa da PIDE, é assassinado em Conacri Amílcar Cabral, líder do PAIGC.
“A notícia da morte de Amílcar Cabral, secretário geral do PAIGC constituiu surpresa, ela não trouxe a menor perturbação ou alterou o ritmo de vida e tranquilidade na Guiné portuguesa. O mesmo não se pode dizer dos países limítrofes onde, aliás, os tons são diferentes. Moderado, o do presidente Senghor do Senegal e descontrolado o de Sukuturé da República da Guiné. Enquanto o primeiro afirma que é pela coexistência pacífica e pelo diálogo, Sukuturé aproveita todas as ocasiões para lançar a África em novas aventuras. Porém, de há muito, grande parte da África está já habituada a este tom demagógico. Desta vez trata-se de mais uma tentativa para se explorar para fins de propaganda um mero caso de assassínio entre facções rivais de guerrilheiros.”
(Comunicado lido na rádio em Bissau)
Foi assim a notícia oficiosa sobre o assassinato do líder do PAIGC, Amílcar Cabral. Ainda em 1973, em Abril, realiza-se em Aveiro o 3º Congresso da Oposição Democrática.
“Uma sessão solene no Teatro Avenida tem início hoje às 21 e 30 o 3º Congresso da Oposição Democrática. Oradores inscritos, os Drs. Seiça Neves, José Tengarrinha e Santos Simões, a Dra Maria Barroso, José Felgueiras, o Dr. António Cardoso e Mendes Coelho. Os trabalhos são terão início realmente amanhã com realização também naquele teatro com várias sessões durante as quais serão debatidas 123 teses divididas por várias secções.”
(Notícia lida na rádio)
A 19 de Abril de 1973, há 25 anos, funda-se o Partido Socialista. Com esta data continuamos a conversa entre o professor Fernando Rosas e o professor António Reis.
Fernando Rosas - Do congresso da fundação do Partido Socialista sai um programa de partido claro.
António Reis - Aí há que fazer uma distinção. De facto o congresso em que o Partido Socialista é fundado em 19 de Abril de 1973 ainda não é sequer formalmente um congresso do Partido Socialista, é o último congresso da Acção Socialista Portuguesa que decide a transformação da ASP em Partido.
Fernando Rosas - Na nomenclatura do PS esse é o primeiro congresso do Partido Socialista ou é o último congresso da ASP?
António Reis - É uma questão que curiosamente não está decidida porque há quem se refira a esse congresso também como o primeiro congresso do PS na clandestinidade por contraposição ao primeiro congresso na legalidade que terá lugar em Dezembro de 74, mas de facto não é um congresso do Partido porque não se aprova aí nenhum documento programático, aprova-se sim um relatório do líder do secretário geral da ASP, Mário Soares, relativamente a toda a actividade desenvolvida pela ASP anteriormente e em que se justifica a necessidade de transformação da ASP em Partido o que acontece imediatamente a seguir é a adesão então já negociada previamente a esse congresso de determinados elementos da Seara Nova, católicos progressistas que permitiram alargar a esfera de influência da ASP da sua tradição para Partido e constituir então, de imediato, o primeiro Secretariado e o primeiro Conselho Directivo do novo Partido por cooptação, no fundo, a partir da estrutura que herdámos da ASP é que se começam a elaborar a declaração de princípios do programa do Partido Socialista que terão uma discussão final em Agosto de 73, em Paris, entre elementos do interior, neste caso eu, o Marcelo Curto e o Sottomayor Cardia e os cinco elementos do Secretariado do exterior, Mário Soares.
Fernando Rosas - Penso que a vossa proposta de programa era bastante mais radical que as outras que estavam em cima da mesa.
António Reis - Curiosamente não era só a nossa proposta do interior que era mais radical, era também a proposta de elementos como Tito de Morais e Ramos da Costa. Só o Campinos e o Mário Soares é que defendiam posições mais moderadas. Portanto a distinção aqui nem sequer foi feita entre os novos elementos que aderiram ao Partido Socialista e os antigos elementos que vinham da ASP, haviam também divergências no seio da própria ASP.
Fernando Rosas – Digamos que era um Partido Socialista com um programa socialista avançado, nacionalizações, reforma agrária.
António Reis - Defesa das classes trabalhadoras e portanto o socialismo avançado, de alguma maneira, mas havia um ponto em que estávamos sempre de acordo que era o respeito pela democracia parlamentar, até um parlamentarismo exagerado nessa altura uma vez que nesse programa nem sequer se contemplava a existência da figura do presidente da República, o presidente do Parlamento é que exerceria as funções de Chefe de Estado e o respeito pelo pluralismo de expressão política, pelas eleições, tudo isso.
Fernando Rosas - Nessa altura quando vocês formam o Partido, de qualquer maneira, PS, novo PS e PC reaproximam-se do ponto de vista da aliança táctica política no interior do país e no exterior.
António Reis - Necessariamente, por um lado porque estávamos na segunda fase do marcelismo em que há um crescente de repressão, em que há um imobilismo total da parte do Regime. Por outro lado, porque havia apesar de tudo sempre aquela plataforma mínima em torno da recuperação das liberdades, da necessidade de uma assembleia constituinte que proclamasse o estado democrático, havia também do ponto de vista da política económica e social uma aproximação na medida em que o próprio PS tinha radicalizado o seu programa nessa área. Portanto combate ao que se chamava na altura o capitalismo monopolista, podia ser também uma base de entendimento e, sobretudo, havia também um entendimento total no que diz respeito à guerra colonial, à necessidade de terminar a guerra e de reconhecimento do direito dos povos à auto-determinação e à independência. As três bases do comunicado do acordo feito em Setembro, traduzido num comunicado conjunto das direcções dos dois partidos e que também esteve, acabou por ter também então uma maneira na sua tradução no próprio programa do MFA.
Fernando Rosas - PS e PC aliás vão em coligação, enfim, unem-se para as eleições de 73 e também no Congresso Republicano.
António Reis - No congresso de Aveiro, o Terceiro Congresso de Oposição Democrática, que se está agora a comemorar o vigésimo quinto aniversário [Fernando Rosas - Congresso da oposição, claro] Exactamente. Há um trabalho conjunto perfeito, bom entendimento, representantes da ainda ASP nesta altura, do PC e doutras correntes de oposição de esquerda nas várias comissões coordenadoras das várias áreas temáticas do Congresso e, por outro lado, nas eleições de 73 não há listas separadas, há um acordo perfeito na composição das listas.
Fernando Rosas - Se pudesse resumir, brevemente, o que é que era, em termos de inserção social, o Partido Socialista nas vésperas do 25 de Abril.
António Reis - O Partido Socialista nessa altura era, sobretudo, um partido de quadros intelectuais, de profissões liberais, de alguns estudantes e com algumas poucas extensões no movimento sindical e operário, dalgumas elites operárias e sindicais, sobretudo, na zona da grande Lisboa, mas era sobretudo portador duma ideia e duma alternativa em termos programáticos e estratégicos para Portugal. Todos nós tínhamos consciência de que uma vez em democracia, uma alternativa como aquela que nós representávamos facilmente seria capaz de captar a adesão de muitíssima gente. Também não vamos exagerar o que era a força do Partido Comunista nessa altura e os outros movimentos tinham. O Partido Comunista teria alguns escassos milhares de militantes na altura e por outro lado sobretudo nós tínhamos uma visão da História muito centrada na Europa da altura e sabíamos que um país como Portugal, fazendo parte desta Europa, necessariamente teria de caminhar para um modelo que não se afastaria muito do modelo das democracias parlamentares da Europa e para muitos de nós que quiséssemos explorar ao máximo aquela margem de originalidade que uma revolução como a nossa poderia permitir nesse contexto, mas apesar de tudo o modelo da democracia parlamentar era um modelo em que todos acreditávamos e estávamos convencidos de que esse modelo poderia permitir uma implantação e um apoio eleitoral vasto no Partido Socialista.
Fernando Rosas - Para terminar, olhando agora para o programa do Partido Socialista de 73 e comparando-o com o Partido Socialista de hoje qual a reacção, verduras da juventude, demagogia política, erro, o que é que mudou, o mundo ou o Partido Socialista ou os militantes socialistas?
António Reis - Mudou sobretudo o mundo e mudou, de alguma maneira também, a ideia da capacidade que uma economia, da margem de manobra duma economia pós-industrial deixa para corrigir as suas injustiças. O que eu penso é que na altura, nós partilhávamos dum sonho que era muito comum em toda a esquerda democrática socialista europeia. Basta ver o nosso modelo inspirador na altura foi o programa comum do Partida Socialista Francês e do Partido Comunista Francês. A opção socialista chilena também, de alguma maneira, representava algo de estimulante para nós nessa altura. Não fomos muito originais nesse aspecto em relação ao que se passava na área socialista democrática dos países do sul da Europa onde a referência em Itália era mais o Partido Comunista Italiano renovado do que propriamente o Partido Socialista Italiano o que eu penso é que todos, portugueses, italianos, franceses e espanhóis acabámos por ter uma experiência comum na tradição, no caso das ditaduras para as democracias, noutro caso da economia dos anos 70 para a economia dos anos 80, marcada por factos tão importantes como a grande crise económica internacional provocada pelo aumento súbito dos preços do petróleo em 73 e que também nos afectou e é uma coincidência que não podemos de maneira nenhuma afastar do horizonte. O facto da nossa revolução ter ocorrido exactamente no auge da crise económica internacional que veio desestabilizar os mecanismos de funcionamento habituais das economias ocidentais e pôr em causa, sobretudo, aquela ideia dum crescimento económico rápido com possibilidade de uma muito melhor distribuição desse produto e de uma maior capacidade de intervenção do Estado como produtor. Tudo isso foi rapidamente posto em causa pelo novo contexto económico da segunda metade dos anos 70, primeira metade dos anos 80, sobretudo a crença no Estado produtor revelou-se uma crença falível.
Fernando Rosas - Mas para os socialistas de hoje não é um bocado desestimulante pensar o mundo sem sonho, sem utopia, como uma espécie de gestão inelutável desta coisa em que vivemos.
António Reis - Ai de nós se abandonarmos a dimensão do sonho e da utopia e, sobretudo, quando fazemos uma experiência de poder infelizmente há uma certa tendência para mergulharmos nessa gestão quotidiana daquilo que está e de perder um pouco essa vontade de transformação. Agora o reformismo não é um imobilismo, não é a gestão do que está, a gestão do que herdámos, tem de visar sempre uma transformação ainda que gradual e talvez não tão rápida como todos nós gostaríamos que viesse a acontecer. Em todo o caso o que eu penso é que também não podemos dar com a cabeça nas paredes por alternativas que, manifestamente, não se ajustam às condições duma economia pós-industrial com as novas tecnologias, com isso tudo e sobretudo há uma coisa nova que entretanto fomos descobrindo é que não é ao nível de um só país ou de dois ou três países aqui na Europa que essas questões podem ter uma resposta eficaz, é ao nível de todo um bloco europeu, integrados num bloco europeu, cujo grande desafio neste momento é justamente combater a hegemonia norte-americana, combater uma globalização sem regras através duma ditadura de ´lobbies´ económicos sem rosto.
Fernando Rosas – Mas o bloco europeu é uma coisa só? O bloco europeu também não tem blocos?
António Reis - O bloco europeu está atravessado de contradições, mais dentro do bloco europeu os próprios governos que têm neste momento à sua frente governantes socialistas [Fernando Rosas - Não há uma esquerda e uma direita ] não pensam da mesma maneira, mais eu estou convencido de que neste momento é capaz de existirem alguns países europeus governados por socialistas, posições mais à direita do que noutros países que não estão a ser governados por socialistas. Neste momento a intervenção socialista na Europa ou o chamado partido socialista europeu é uma montra de tendências e correntes bastantes distintas, umas que estão muito à direita, caso de Tony Blair em Inglaterra, o caso máximo, mas não só. Os holandeses também não andam muito longe disso e de correntes muito mais à esquerda como a protagonizada pelo Partido Socialista Francês.
Fernando Rosas - Muito obrigado. Falámos um pouco do Partido Socialista de ontem e do Partido Socialista de hoje, mas acerca deste segundo voltaremos a ter oportunidades para falar mais um pouco.
Com mãos se faz a paz se faz a guerra
Com mãos tudo se faz e se desfaz
Com mãos se faz o poema e são de terra
Com mãos se faz a guerra e são a paz
Com mãos se rasga o mar
Com mãos se lavra
Não são de pedra estas casas mas de mãos
E estão no fruto e na palavra as mãos
Que são o canto e são as árvores
E cravam-se no tempo como farpas
As mãos que vez nas coisas transformadas
Folhas que levam o vento verdes harpas
De mãos é cada flor, cada cidade
Ninguém pode vencer estas espadas
Nas tuas mãos começa a liberdade
(Poema recitado por Manuel Alegre)
“O marcelismo, as oposições, o Partido Socialista” contou com as colaborações de Fernando Rosas e António Reis.
1973, ano em que o Movimento dos Capitães consolida ligações de informações dentre quartéis. Em Novembro reúne na Costa da Caparica a Comissão coordenadora do Movimento dos Capitães. É eleito um secretariado executivo, constituído por Vasco Lourenço, Otelo Saraiva de Carvalho e Vítor Alves e formadas várias comissões que inicia o processo de preparação de um golpe militar, o 25 de Abril de 1974 estava próximo.
No meu país há uma palavra proibida
Mil vezes a prenderam, mil vezes cresceu
E pulsa em nós como o pulsar da própria vida
Sabe ao sol deste mar, tem a cor deste céu
No meu país há uma palavra proibida
No meu país há uma palavra que se diz
Com a mesma ternura da palavra irmã
Palavra quente como o sol do meu país
Palavra clara como é cada manhã
Apesar da tristeza lá no meu país
No meu há uma palavra que se escreve
Sobre os muros à pressa pela noite dentro
Uma palavra assim nenhuma língua a teve
Pela ausência, presença tão feita de vento
Tão impossível de apagá-la onde se escreve
No meu país há uma palavra onde se guarda
Tudo o que se não teve, tudo o que não foi
Por ela a humilhação fabrica uma espingarda
E há um tempo de luta no tempo que doe
Nessa palavra que nos guia que nos guarda
Palavra que murmura nos verdes pinheiros
O recado que o mar vem escrever nas areias
Se já em nós morreram velhos marinheiros
Há uma palavra que se vê em nossas veias
No país que murmura nos verdes pinheiros
No meu país em cada homem há uma palavra
Que rasga as trevas e as prisões
Palavra chave capaz de transformar em asa a mão que lavra
E é inútil prenderem-na que é luz e ave
No meu país em cada homem há essa palavra
Palavra feita de montanhas, praias, vento
De verde pinho e mar azul, de sol, de sal
Não vale pena proibirem em pensamento
Há uma palavra clandestina em Portugal
Que se escreve com todas as artes do vento
(Poema recitado por Manuel Alegre)
Fizeram este programa Rosa Maria, Henrique Soares, Maria dos Anjos Pinheiro e Esmeralda Serrano)

(Programa gravado da Antena 2 no dia 17 de Abril de 1998)
Transcrção: Ireneu Batista