Coleções - Legislação - Lei de arrendamento rural (Dec.-Lei 201/75 de 15 de Abril)

LEI DO ARRENDAMENTO RURAL

DECRETO-LEI N.° 201/75 DE 15 DE ABRIL

O arrendamento rural constitui uma forma de exploração da terra largamente generalizada no nosso país. E de cerca de 300 000 o número de explorações agrícolas que se encontram submetidas ao regime de arrendamento. Tal significa que em mais de um terço de explorações quem efectivamente explora e cultiva a terra não é o seu proprietário.
Assim, o arrendamento ocupa uma posição de relevo na vida agrícola portuguesa, tanto nos seus aspectos económicos como sociais. Não obstante, porém, a sua importância, o certo é que a legislação até agora vigente concedeu sempre uma posição de privilégio ao proprietário da terra. E, deste modo, ao beneficiar o direito de propriedade, não só atentava contra os justos direitos do rendeiro - o que efectivamente explora a terra -, como, por via disso, afectava o desenvolvimento da actividade agrícola nacional.
Na verdade, a legislação anterior, traduzindo toda uma mentalidade retrógrada e senhorial, colocava numa posição subalterna os direitos do agricultor não proprietário, pelo que o rendeiro se encontrava numa situação de inferioridade em relação ao senhorio, o que constituía um forte obstáculo à expansão e melhoria das condições de vida daqueles que trabalham nos campos.
De facto, não eram concedidas as condições básicas ao rendeiro para que pudesse realizar uma exploração eficiente e compensadora. O rendeiro não tinha segurança de que continuava a explorar a terra. Não lhe era dada garantia de continuidade para a sua actividade. Tal constituía um entrave à modificação dos processos de cultivo das terras, à reconversão das culturas, à introdução de equipamentos e à realização de benfeitorias.
Deste modo, colocado na dependência da vontade do senhorio, o rendeiro não aplicava os seus dinheiros e o seu esforço para alterar e modernizar as suas explorações. Daqui a baixa produtividade e a estagnação da produção, com os graves reflexos na situação do sector agrícola e do desenvolvimento económico do País.
Acresce ainda que, segundo o regime legal anterior, o senhorio tinha sempre a faculdade de elevar as rendas no termo dos períodos de arrendamento. Daqui resultava que, em largas zonas do País, onde era mais intensa a procura de terra para cultivar, onde existia fome de terra, as rendas tivessem atingido valores extremamente elevados, agravando os custos de produção e provando uma injusta repartição dos rendimentos das explorações, do que derivava uma situação de nítido desfavor para os rendeiros que, afinal, são os que efectivamente exploram e trabalham a terra.
Estes factos, só por si, impunham a definição de um novo regime legal do arrendamento rural que se integrasse dentro da orientação de realizar a «dinamização da agricultura e reforma gradual da estrutura agrária», objectivos fixados ao Governo Provisório em obediência e de acordo com os princípios e directrizes do Programa das Forças Armadas.
Assim, foi elaborado um projecto de decreto que veio a ser submetido à apreciação e discussão públicas nos primeiros dias de Outubro, a fim de, por este modo próprio da vida democrática, se auscultar e recolher a opinião do País acerca da justeza e eficiência das medidas projectadas e da sua aplicação às diferentes zonas do território nacional.
Pode afirmar-se que a apreciação do projecto de diploma despertou enorme e vivo interesse e mereceu, o que se regista com satisfação, uma participação activa e colaborante, particularmente de agricultores, trabalhadores rurais, cooperativas agrícolas, técnicos agrários, juristas, economistas, centros de estudos de técnicos agrários e comissões de agricultura dos diferentes partidos políticos.
A Secretaria de Estado da Agricultura promoveu, através dos serviços regionais, a realização em todo o território de algumas centenas de reuniões, parte das quais em povoações até agora mais ignoradas, para desta forma se captar, na fonte, o conhecimento exacto das situações e a apresentação das ideias e sugestões conducentes à correcta e justa solução do problema do arrendamento.
De toda esta acção de auscultação, iniciativa que teve a adesão e participação dos diferentes órgãos de informação, os quais dedicaram ao problema particular relevo, resultou um somatório vasto de relatórios, exposições, cartas, artigos e entrevistas, contendo críticas, sugestões e propostas de alteração.
Assim, a comissão criada na Secretaria de Estado da Agricultura para examinar as recomendações apresentadas teve de realizar um trabalho exaustivo para, dada a vastidão da documentação e a importância do problema, propor as alterações e os ajustamentos que traduzissem, tanto quanto possível, o consenso geral dentro da orientação progressiva do Governo.
A natureza e complexidade dos trabalhos exigiram tempo para uma análise cuidadosa e ponderada. Terá tardado a publicação do presente diploma mas poderá afirmar-se que o que se perdeu em tempo se ganhou na fixação de medidas mais progressivas.
Refira-se, ainda, que o Governo não deixou de, entretanto, tomar as providências necessárias para acautelar a situação dos rendeiros, nomeadamente ao impedir que os senhorios procedessem ao seu despedimento, dando deste modo continuidade aos contratos que passarão a regular-se pelo presente diploma.
Importa, por último, assinalar que este decreto se insere dentro do quadro de medidas conducentes à alteração da estrutura agrária do País que se encontram anunciadas e delineadas no Programa Económico e Social aprovado pelo Governo.
Terá, pois, de ser completado e articulado com outras providências legislativas - o que será feito - por forma a defender e proteger efectivamente os legítimos interesses das camadas mais empobrecidas da população rural.
Nestes termos:
Usando da faculdade conferida pelo artigo 16.°, n.° 1, 3.°, da Lei Constitucional n.° 3/74, de 14 de Maio, o Governo decreta e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:

I - DISPOSIÇÕES GERAIS 

ARTIGO 1.°

(Noções)

1. O arrendamento de prédios rústicos, no todo ou em parte, para fins de exploração agrícola, pecuária ou florestal, nas condições de uma regular utilização, denomina-se arrendamento rural.
2. Considera-se arrendamento ao cultivador directo aquele que tem por objecto um ou mais prédios que o rendeiro explore exclusiva ou predominantemente com o seu próprio trabalho executivo ou o das pessoas do seu agregado familiar.
3. Para os efeitos do número anterior entende-se por agregado familiar o conjunto de pessoas, ligadas entre si por qualquer grau de parentesco, que vivam habitualmente em comunhão de mesa e habitação ou em economia comum com o rendeiro.
4. Se o arrendamento recair sobre o prédio rústico e do contrato e respectivas circunstâncias não resultar o destino atribuído ao prédio, presume-se rural; exceptuam-se os arrendamentos em que intervenha como arrendatário o Estado ou uma pessoa colectiva pública, os quais se presumem celebrados para os fins de interesse público próprios dessas entidades.

II - CONSTITUIÇÃO

ARTIGO 2.º

(Forma do contrato)

1. O contrato de arrendamento rural é obrigatoriamente reduzido a escrito.
2. O senhorio deve entregar o original, certidão ou fotocópia autenticada do contrato na repartição de finanças do concelho onde se localiza o prédio arrendado e uma cópia no Instituto de Reorganização Agrária, dentro do prazo máximo de trinta dias a contar da respectiva assinatura.
3. Os arrendamentos rurais não estão sujeitos a registo predial.
4. No caso de não cumprimento do disposto no n.° 1, os contratantes não poderão requerer qualquer procedimento judicial relativo ao contrato, a menos que aleguem, e venham a provar, que a falta é imputável ao outro contratante.
Presume-se que a falta é imputável ao contratante que, tendo sido notificado para assinar o contrato dentro de prazo razoável, injustificadamente se tenha recusado a isso.
5. No caso de não cumprimento do disposto no n.° 2, o senhorio, além de não poder requerer qualquer procedimento judicial contra o rendeiro, relativo ao contrato, enquanto não efectuar as entregas ali prescritas, ficará sujeito ao pagamento de multa igual ao triplo da renda correspondente aos meses completos da duração do incumprimento que lhe for imputável.

ARTIGO 3.°

(Âmbito do contrato)

1. O arrendamento rural, além do terreno com o arvoredo e demais vegetação permanente que nele existir, compreende todas as coisas implantadas ou presas ao solo e ainda aquelas que, embora não fazendo parte dessas coisas, são, contudo, indispensáveis para o desempenho da sua função económica normal.
2. Quaisquer outras coisas existentes no prédio e que não satisfaçam as características referidas no numero anterior devem ser expressamente relacionadas no contrato, sob pena de não ficarem compreendidas no arrendamento.
3. Mediante acordo das partes expressamente consignado no contrato, podem, contudo, ser excluídos do arrendamento o arvoredo florestal, os frutos pendentes à data do arrendamento e os edifícios afectos a unidades fabris, económicas, habitacionais ou de recreio que não sejam complementares ou acessórias da exploração agrícola, pecuária ou florestal, nem indispensáveis ao desempenho da função económica e social normal do prédio arrendado.

ARTIGO 4.º

(Cláusulas proibidas)

Consideram-se não escritas as cláusulas por virtude das quais:

a) O rendeiro se obrigue a vender as colheitas, no todo ou em parte, a entidades certas e determinadas;
b) O rendeiro se obrigue ao pagamento de prémios de seguro contra incêndios de edifícios, de deteriorações do prédio arrendado, ainda que não inerentes à sua prudente utilização em conformidade com os fins do contrato, bem como de contribuições, impostos ou taxas que incidam sobre os prédios compreendidos no arrendamento e que sejam devidos pelo senhorio;
c) Qualquer dos contraentes renuncie ao direito de pedir a rescisão do contrato e as indemnizações que forem devidas nos casos de violação de obrigações legais ou contratuais;
d) O rendeiro renuncie ao direito de renovação do contrato ou se obrigue antecipadamente a pedir a sua denúncia;
e) O rendeiro se obrigue, por qualquer título, a serviços que não revertam em benefício directo do prédio ou se sujeite a encargos extraordinários ou casuais não compreendidos na renda;
f) As partes subordinem a eficácia ou validade do contrato a condição resolutiva ou suspensiva;
g) Se ofendam princípios ou direitos declarados neste diploma.
ARTIGO 5.º

(Prazo do arrendamento}

1. Salvo no caso previsto no n.° 3 deste artigo, os arrendamentos rurais não podem ser celebrados por prazo inferior a seis anos; quando convencionada duração mais curta valerão por aquele prazo.
2. Findo o prazo estabelecido no número anterior, ou o convencionado, se for superior, considera-se automaticamente prorrogado o prazo do contrato por períodos iguais e sucessivos de três anos, enquanto o contrato não for denunciado nos termos deste diploma.
3. Os arrendamentos ao cultivador directo terão a duração mínima de um ano, automaticamente prorrogável, nos termos do número antecedente, qualquer que seja o prazo inicial, por períodos sucessivos de um ano.
4. O termo de qualquer prazo corresponderá sempre ao fim do ano agrícola em curso, que deve ser expressamente indicado em todos os contratos.

ARTIGO 6.º

(Natureza e montante da renda)

1. A renda será obrigatoriamente fixada em dinheiro. O rendeiro cultivador directo terá, não obstante, a faculdade de efectuar o pagamento da renda em géneros produzidos no prédio arrendado, em termos a regulamentar.
2. No caso de o rendeiro cultivador directo usar da faculdade prevista no número anterior, os géneros serão valorizados ao preço de compra oficial do momento do vencimento da renda ou, no caso de se não encontrar fixado, ao preço corrente na região. Em caso de divergência sobre qual seja este preço, será a mesma resolvida por parecer escrito da comissão arbitrai da área respectiva, a pedido de qualquer das partes.
3. Os valores máximos das rendas serão fixados anualmente, até ao dia 31 de Janeiro, relativamente a cada região e às diferentes classes de terra e formas de aproveitamento, por portaria da Secretaria de Estado da Agricultura, ouvidas as respectivas comissões arbitrais.
4. Se o contrato abranger ou se destinar a abranger edifícios, dependências, instalações ou equipamentos existentes no prédio arrendado ou a arrendar, poderão ser excedidos os valores máximos fixados nos termos do número antecedente, na medida da correspondente sobrevalorização.
5. Se se verificar qualquer das circunstâncias previstas no número anterior, podem as partes requerer a fixação ou revisão da renda à comissão arbitral, que decidirá segundo a equidade e em última instância.
6. Sem prejuízo de alterações consensuais a todo o tempo, dentro dos valores fixados nos termos deste artigo, o valor da renda poderá ser revisto, de três em três anos, dentro dos mesmos valores, pela comissão arbitral, a requerimento, por escrito, de qualquer das partes. O direito de revisão deve ser exercido nos sessenta dias imediatos ao termo de cada triénio, sob pena de só poder voltar a sê-lo no termo do triénio seguinte.
7. Não é exigível o pagamento antecipado da renda. O rendeiro tem, não obstante, a faculdade de antecipar, até ao máximo de seis meses, o pagamento, no todo ou em parte, da renda do ano agrícola em curso, desde que o efectue em numerário.

III - MODIFICAÇÃO

ARTIGO 7.º

(Mora do rendeiro)

1. Quando, por causa que lhe seja imputável, o rendeiro não pagar a renda no tempo e forma devidos, o senhorio, decorridos três meses sobre o início da mora, tem o direito de exigir judicialmente, além das rendas em atraso, os respectivos juros, calculados nos termos da lei civil, salvo, quanto aos juros, se obtiver a resolução do contrato com fundamento na falta de pagamento da renda.
2. Cessa o direito à resolução do contrato, se o rendeiro provar nos autos, até à contestação da acção destinada a fazer valer esse direito, que pagou ao senhorio, ou depositou à ordem deste a renda devida e os respectivos juros.

ARTIGO 8.° 

(Redução de renda e pagamento em prestações)

1. Quando o prédio arrendado não produzir frutos ou os frutos pendentes se perderem, no todo ou em parte, sem culpa do rendeiro e por causas imprevisíveis tais como inundações, estiagens extraordinárias, acidentes meteorológicos ou geológicos, pragas de natureza excepcional ou outras, ou quando dessas causas resultar diminuição significativa da capacidade produtiva do prédio, o rendeiro tem direito a redução proporcional da renda, que poderá ainda ser paga em prestações.
2. Ao rendeiro assistirá ainda o direito de obter a resolução do contrato quando as causas referidas no número antecedente tiverem como consequência uma diminuição significativa e duradoura da capacidade produtiva do prédio.
3. Os pedidos de redução da renda e do pagamento em prestações deverão ser feitos pelo rendeiro ao senhorio, sob pena de ineficácia, por carta registada com aviso de recepção, ou por escrito simples com cobrança de recibo, no prazo máximo de trinta dias, posterior ao termo dos eventos causais do resultado invocado em justificação dos mesmos pedidos, presumindo-se que não tiveram lugar sempre que o rendeiro não proporcione ao senhorio a verificação, em si ou nos respectivos resultados, dos sinais aparentes dos referidos eventos, ou os não faça verificar por inspecção requerida à comissão arbitrai.
4. No caso de as partes, nos trinta dias seguintes à formulação do respectivo pedido, não chegarem a acordo sobre a redução da renda, ou sobre o pagamento em prestações, deverão recorrer à comissão arbitrai, por iniciativa de qualquer delas, para que resolva o diferendo segundo a equidade e em última instância.
5. Enquanto não for proferida a decisão da comissão arbitrai, o senhorio não poderá requerer a resolução do contrato com fundamento em falta de pagamento das rendas, nem exigir judicialmente o pagamento destas.

ARTIGO 9.°

(Revisão da renda)

1. Se, por virtude de nova lei ou providências tomadas pela Administração ou por 
empresas concessionárias de serviço público, for diminuída a rendibilidade do prédio, o rendeiro pode pedir a redução equitativa da renda,
2. São aplicáveis neste caso os prazos e o processo estabelecido nos n.ºs 3, 4 e 5 do artigo anterior.

ARTIGO 10.º

(Benfeitorias feitas pelo rendeiro)

1. O rendeiro pode fazer benfeitorias necessárias ou úteis sem consentimento do senhorio, designadamente as que visem aumentar a fertilidade, valorizar o equilíbrio biológico, melhorar as condições de exploração agrária ou as condições sociais de vida dos trabalhadores, desde que não prejudiquem a substância ou o destino económico do prédio.
2. Se houver consentimento por escrito do senhorio, ou se este tiver sido suprido pela comissão arbitrai, o rendeiro, findo o contrato, tem o direito de exigir o valor das benfeitorias consentidas.
3. O rendeiro tem o direito de constituir ónus reais sobre as benfeitorias referidas no n.° 1, em garantia de financiamentos obtidos com vista à sua efectivação, e nelas efectivamente investidos, igualmente com consentimento escrito do senhorio, ou com suprimento desse consentimento, nos termos do número precedente, sendo que, findo o contrato, o encargo do pagamento do saldo em dívida desses encargos se transferirá para o senhorio, recebendo o rendeiro apenas a diferença entre esse saldo e o valor correspondente às benfeitorias.
4. Na decisão sobre o pedido de suprimento da autorização do senhorio, a comissão arbitrai deverá considerar especialmente a utilidade que, das benfeitorias, resultar para o aumento da capacidade produtiva do prédio ou para melhorar as condições de habitabilidade e das instalações sociais dos que trabalham a terra.
5. No arrendamento ao cultivador directo o direito conferido no n.° 2 deste artigo não depende do consentimento do senhorio.
6. O valor das benfeitorias será o seu valor à data da extinção do arrendamento e, em caso de desacordo entre o senhorio e o rendeiro, será fixado pela comissão arbitral, a pedido de qualquer deles.
7. As benfeitorias realizadas pelo rendeiro não justificam a revisão do montante da renda.
8. O senhorio, quando não obtenha o empréstimo previsto no n.° 1 do artigo 12.°, poderá, na falta de acordo com o rendeiro, requerer à comissão arbitrai a faculdade de efectuar em prestações o pagamento da indemnização devida ao rendeiro, em razão de benfeitorias realizadas por este, justificando os fundamentos do pedido.
9. O rendeiro goza do direito de retenção do uso do prédio enquanto não tiver sido indemnizado do valor das benfeitorias necessárias ou úteis, nos termos dos números precedentes e ressalvada a hipótese prevista no n.° 8.
O rendeiro tem ainda o direito de ser indemnizado pelo montante das despesas de cultura, sementes, matérias-primas e restantes encargos de produção, feitos ou gastos durante o período da retenção, acrescidas de uma percentagem correspondente ao lucro normal da colheita, se e na medida em que não tiver chegado a colher os frutos correspondentes.
Em contrapartida, o senhorio tem direito à renda correspondente ao período da retenção.
10. O rendeiro pode levantar, até ao termo do contrato, as benfeitorias não necessárias que tenha feito, se o puder fazer sem prejudicar o prédio, cessando, neste caso, em relação às benfeitorias levantadas, o direito referido nos n.ºs 2 e 5.
11. O rendeiro goza de hipoteca legal, nos termos dos artigos 704.° e seguintes do Código Civil, sobre o prédio arrendado, em garantia do seu direito a ser indemnizado por benfeitorias, necessárias ou úteis, efectuadas no prédio, desde que autorizadas pelo senhorio ou com suprimento do consentimento deste.
A determinação do valor da hipoteca, para efeito de registo, e a designação do prédio, ou da parte dele sobre que há-de ser registada cabem, na falta de acordo, à comissão arbitrai.
12. No caso de as benfeitorias, necessárias ou úteis, feitas pelo rendeiro cultivador directo, se revelarem, no termo do prazo do contrato, de valor correspondente a metade do valor do prédio, não tomada em conta na avaliação deste a valorização devida a actividade do rendeiro, tem este o direito de adquirir o prédio, ou de, em alternativa, prorrogar o prazo do contrato por novo prazo até dezoito anos.
Compete à comissão arbitral avaliar o prédio e as benfeitorias, e ainda, se o rendeiro requerer essa faculdade, fixar o pagamento do preço do prédio em prestações, segundo princípios de equidade.
Os direitos dos rendeiros, previstos neste número, devem ceder em face da salvaguarda da subsistência económica do senhorio, e respectivo agregado familiar, se a comissão arbitrai entender que é caso disso.

ARTIGO 11.º

(Benfeitorias feitas pelo senhorio)

1. O senhorio pode fazer as benfeitorias que sejam consentidas pelo rendeiro, ou, na falta de consentimento deste, autorizadas pela comissão arbitrai.
2. O senhorio indemnizará o rendeiro pelos prejuízos que lhe causarem as obras.
3. Se das benfeitorias consentidas por escrito pelo rendeiro ou autorizadas pela comissão arbitrai resultar aumento da produtividade do prédio, o senhorio pode requerer a revisão da renda de acordo com os valores a que se refere o artigo 6.°.
4. Quando os melhoramentos importarem alteração sensível do regime de exploração do prédio ou o rendeiro se não conformar com o acréscimo da renda, tem este a faculdade de denunciar o contrato.
5. A denúncia só produz os seus efeitos no fim do ano agrícola em que se iniciem as obras ou em que o rendeiro tenha conhecimento do aumento da renda.
ARTIGO 12.º 

(Crédito para benfeitorias)

1. O Estado poderá conceder empréstimos aos senhorios para efeitos de prestarem indemnização aos rendeiros por benfeitorias necessárias ou úteis feitas por estes, bem como aos rendeiros para poderem fazer benfeitorias necessárias e úteis, inclusivamente a melhoria das condições de habitabilidade, cantinas ou outras instalações sociais.
2. No caso de o empréstimo ter sido concedido ao rendeiro, a extinção do arrendamento dá causa à transferência para o senhorio da responsabilidade dos encargos de amortização do capital ao tempo em dívida, até à concorrência do valor previsto no n.° 6 do artigo 10.° e desde que se verifique o condicionalismo do n.° 2 do mesmo artigo.

IV - EXTINÇÃO 

A) Denúncia

ARTIGO 13.°

(Denúncia: principio geral)

O prazo do contrato de arrendamento rural considera-se sucessiva e automaticamente prorrogado se não for denunciado pelo rendeiro, mediante comunicação escrita ao senhorio, com a antecedência mínima, sobre o termo do prazo em curso, a seguir indicada:

a) Um ano nos arrendamentos referidos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 5.°.
b) Dois meses nos arrendamentos referidos no n.° 3 do artigo 5.°.

ARTIGO 14.º

(Denúncia: excepções)

1. O senhorio pode, em conformidade com os artigos 15.° a 17.°, denunciar o contrato, para o efeito de ele próprio, seus cônjuge, descendentes ou ascendentes passarem a explorar directamente o prédio arrendado.
2. A denúncia do contrato pelo senhorio não poderá, porém, ser declarada sem que tenham decorrido dezoito anos sobre o início do arrendamento.
ARTIGO 15.º

(Denúncia pelo senhorio: forma, prazo e requisitos)

1. A denúncia pelo senhorio deve ser requerida à comissão arbitral, com a antecedência mínima de um ano relativamente ao termo do prazo inicial ou ao de qualquer das suas prorrogações.
2. A decisão definitiva que reconheça ao senhorio o direito de denúncia deverá declarar a época em que poderá efectivar o despejo, a qual será marcada de harmonia com as circunstâncias de cada caso, mas nunca antes do termo do ano agrícola.
3. A comissão arbitral ou o tribunal de recurso só poderão reconhecer o direito de denúncia, em relação a arrendamentos feitos a cultivadores directos, desde que o senhorio não tenha usado desta faculdade há menos de três anos, e desde que do seu exercício não resulte prejuízo para a subsistência económica do rendeiro e do respectivo agregado familiar, em função do respectivo nível de vida granjeado pelo próprio trabalho, a menos que a exclusão do direito de denúncia acarrete prejuízo para a subsistência económica do senhorio e respectivo agregado familiar.
4. O contrato de arrendamento rural não caduca com a cessação dos direitos ou o fim dos poderes legais de administração com base nos quais foi celebrado, nem com a dissolução do casamento do locador ou com a decretação da sua separação judicial de pessoas e bens, ainda que o prédio arrendado seja de natureza dotal.

ARTIGO 16.º

(Indemnização pela denúncia)

1. O senhorio fica obrigado a prestar ao rendeiro, cultivador directo, pela denúncia do contrato, uma indemnização, a fixar pela comissão arbitral ou pelo tribunal de recurso, consoante as circunstâncias do caso, até ao limite de um ano de renda.
2. Se a denúncia for essencial para a subsistência económica do senhorio e do seu agregado familiar, não é devida a indemnização prevista no número anterior.
3. O não pagamento da indemnização a que se refere o n.° 1 suspende e execução do despejo.
ARTIGO 17.º

(Reocupação do prédio}

1. O senhorio que retome o prédio, nos termos dos artigos anteriores, fica obrigado a explorá-lo por conta própria, de modo efectivo e permanente, durante o prazo mínimo de seis anos, salvos motivo de força maior ou outra causa que lhe não seja imputável.
2. Em caso de inobservância do disposto no número antecedente o rendeiro despedido tem direito a reocupar o prédio, iniciando-se novo contrato, desde que o requeira à comissão arbitral no prazo de trinta dias a contar do conhecimento do facto. Se, entretanto, o senhorio tiver, com violação da obrigação que o número antecedente lhe comete, assinado novo contrato de arrendamento com terceiro de boa fé, consistente na ignorância da referida violação, cabe à comissão arbitrai decidir, a pedido do rendeiro despedido ou do novo rendeiro, pela nulidade do novo contrato, com direito do novo rendeiro a ser indemnizado pelo senhorio, nos termos gerais, ou pela sua subsistência, com igual direito do rendeiro despedido.
3. Quando o rendeiro despedido não usar da faculdade de reocupação do prédio, nos termos do número antecedente, o Instituto de Reorganização Agrária tem o direito de tomar de arrendamento o prédio em causa, nos termos em que é garantido ao rendeiro despedido.
4. Em qualquer dos casos de incumprimento pelo senhorio previstos neste artigo, fica o mesmo obrigado a pagar ao Instituto de Reorganização Agrária uma multa igual ao dobro da renda que recebia pelo contrato denunciado, correspondente à diferença entre o período em que efectivamente explorou o prédio e o prazo mínimo referido no n.° 1.

B) Resolução

ARTIGO 18.º

(Resolução do contrato)

1. A resolução do contrato fundada na falta de cumprimento por parte do rendeiro tem de ser decretada pela comissão arbitral ou pelo tribunal de recurso.
2. O senhorio só pode resolver o contrato se o rendeiro:

a) Não pagar a renda no tempo, forma e lugar próprios nem fizer depósito liberatório;
b) Faltar ao cumprimento de alguma obrigação legal com prejuízo grave para a produtividade, substância ou função económica e social do prédio;
c) Utilizar processos de cultura comprovadamente depauperantes da potencialidade produtiva dos solos;
d) Não velar pela boa conservação dos bens ou causar prejuízos graves nos que, não sendo objecto de contrato, existam no prédio arrendado;
e) Subarrendar, emprestar ou ceder por comodato, total ou parcialmente, o prédio arrendado, ou ceder a sua posição contratual em face do senhorio nos casos não permitidos.

C) Caducidade

ARTIGO 19.°

(Caducidade por expropriação)

1. A expropriação por utilidade pública do prédio arrendado importa a caducidade do arrendamento.
2. Se a expropriação for total, o arrendamento é considerado encargo autónomo para o efeito de o rendeiro ser indemnizado pelo expropriante; na indemnização, além do valor dos frutos pendentes ou das colheitas inutilizadas, acrescido do valor das benfeitorias a que tenha direito, será considerado o prejuízo do rendeiro pela cessação do arrendamento, calculado nos termos gerais de direito.
3. Se a expropriação for parcial, o rendeiro, independentemente dos direitos facultados no número anterior em relação à parte expropriada, pode optar pela resolução do contrato ou pela redução proporcional da renda.

D) Acto da Administração

ARTIGO 20.º

(Extinção do arrendamento por acto do Instituto de Reorganização Agrária)

1. O Instituto de Reorganização Agrária pode fazer cessar quaisquer contratos de arrendamento rural quando se verifique alguma das seguintes circunstâncias:

a) Necessidade de reestruturação agrária, salvo se a extinção do arrendamento fizer perigar a subsistência económica do rendeiro ou do respectivo agregado familiar;
b) Manter o rendeiro o prédio arrendado no estado de inculto ou subaproveitado, ainda que seja só em parte, podendo o Instituto de Reorganização Agrária conceder-lhe a faculdade de proceder ao seu adequado aproveitamento, dentro do prazo a fixar e segundo um plano de exploração de sua iniciativa, aprovado por aquele Instituto;
c) Incorrer o rendeiro em falta significativa ao cumprimento de disposições económico-sociais estabelecidas na lei ou em convenções colectivas de trabalho, nomeadamente quanto à obrigação de emprego ou de pagamento de salários, a menos que a falta resulte de acatamento do disposto em plano de exploração aprovado pelo Instituto de Reorganização Agrária;
d) Não prestar o rendeiro que não seja cultivador directo as informações de natureza técnico-económica que lhe forem solicitadas pelos organismos oficiais ou, de algum modo, obstar à acção dos técnicos da Secretaria de Estado da Agricultura, quando em serviço oficial.

2. Se o arrendamento cessar nos termos das alíneas b), c) e d) do número anterior, o Instituto de Reorganização Agrária poderá notificar o senhorio para declarar, no prazo de trinta dias, se deseja proceder ao cultivo ou aproveitamento adequado, directamente ou através de novo rendeiro, actuando nos termos do artigo 22.° quando se verificar recusa ou falta de resposta.
3. No caso previsto na alínea a) do n.° l, ficarão a cargo do Instituto de Reorganização Agrária as indemnizações a que o rendeiro tiver direito, calculadas nos termos do n.° 2 do artigo 19.°.
4. No caso de cessação do contrato com fundamento nas alíneas b), c) e d) do n.° 1, o rendeiro perde o direito à indemnização por benfeitorias.

V - TRANSMISSÃO 

A) Morte do rendeiro

ARTIGO 21.º

(Transmissão do direito ao arrendamento)

1. O arrendamento rural não caduca por morte do senhorio, nem pela transmissão do prédio, nem quando cesse o direito ou findem os poderes legais de administração com base nos quais o contrato foi celebrado.
2. O arrendamento rural também não caduca por morte do rendeiro e transmite-se ao cônjuge sobrevivo não separado de pessoas e bens ou de facto, parentes ou afins até ao 4.° grau que com o mesmo vivam habitualmente em comunhão de mesa e habitação ou em economia comum.
3. A transmissão a que se refere o artigo anterior defere-se pela ordem seguinte:

a) Ao cônjuge sobrevivo;
b) Aos parentes ou afins de linha recta, preferindo os primeiros aos segundos, os descendentes aos ascendentes e os de grau mais próximo aos de grau mais afastado;
c) Aos parentes ou afins do 2.° grau da linha colateral, preferindo os primeiros aos segundos;
d) Aos restantes parentes e afins, preferindo os primeiros aos segundos e os de grau mais próximo aos de grau mais afastado.

4. A transmissão a favor dos parentes ou afins, dentro dos limites e segundo a ordem estabelecidos nos números anteriores, também se verifica por morte do cônjuge sobrevivo quando, nos termos deste artigo, lhe tenha sido transmitido o direito ao arrendamento,
5. O arrendamento, todavia, caducará quando o direito à sua transmissão, conferido neste artigo, não for exercido nos três meses seguintes à morte do rendeiro, ou do cônjuge não separado de pessoas e bens ou de facto, mediante comunicação escrita ao senhorio, mas a restituição do prédio nunca poderá ser exigida antes do fim do ano agrícola em curso no termo daquele prazo.

B) Intervenção do IRA

ARTIGO 22.º

(Arrendamento por acto do Instituto de Reorganização Agrária)

1. O Instituto de Reorganização Agrária tem o direito de tomar de arrendamento:

a) Os prédios incultos ou subaproveitados, podendo, porém, o Instituto conceder ao proprietário a faculdade de proceder ao seu adequado aproveitamento, dentro de prazo a fixar e segundo um plano de exploração, de sua iniciativa, aprovado por aquele organismo;
b) Os prédios necessários para efeitos de reestruturação agrária de acordo com planeamento aprovado;
c) Os prédios cujos empresários faltem ao cumprimento das disposições económico-sociais estabelecidas em lei ou em convenções colectivas de trabalho, nomeadamente quanto a emprego e salários;
d) Os prédios cujos senhorios tenham procedido ao despejo dos rendeiros em contravenção das disposições do artigo 15.°;
e) Os prédios cujos senhorios e rendeiros não cultivadores directos não prestem as informações de natureza técnico-económica que lhes forem solicitadas pelos organismos oficiais ou, de algum modo, obstarem à acção dos técnicos da Secretaria de Estado da Agricultura, quando em serviço oficial.

2. As cooperativas de produção de pequenos agricultores e trabalhadores rurais, existentes nas zonas onde houver terras incultas ou subaproveitadas, poderão requerer ao Instituto de Reorganização Agrária que as tome de arrendamento, a fim de lhes ceder o respectivo direito, nos termos da alínea b) do artigo 24.°.

ARTIGO 23.°

(Fixação do valor da renda nos arrendamentos por acto do IRA)

As rendas a pagar pelo Instituto de Reorganização Agrária ao proprietário dos prédios arrendados nos termos das alíneas a), c), d) & e) do n.° 1 do artigo anterior e do n.° 2 do artigo 20.° serão fixadas tendo em conta o rendimento efectivo dos prédios no momento do arrendamento, não podendo exceder 70% do valor fixado nos termos do artigo 6.°. Em caso de subarrendamento desses prédios pelo Instituto de Reorganização Agrária, a renda deverá ser fixada nos termos normais, com prévia audição do proprietário, com atribuição do seu montante total ao senhorio.

ARTIGO 24.º

(Subarrendamento e cessão do direito ao arrendamento)

1. É proibido o subarrendamento, total ou parcial, excepto se o rendeiro ou o sub-rendeiro for o Instituto de Reorganização Agrária.
2. A cessão do direito ao arrendamento por rendeiro diverso do Instituto de Reorganização Agrária só é permitida nas condições seguintes:
a) Desde que realizada a favor de cooperativas de produção de pequenos agricultores e trabalhadores rurais;
b) Desde que se destine a acções de parcelamento ou emparcelamento, a realizar por iniciativa ou com aprovação do Instituto de Reorganização Agrária.

3. O subarrendamento e a cessão do direito ao arrendamento, nos casos excepcionais em que são permitidos, não dependem do consentimento do senhorio, mas devem ser-lhe notificados, bem como ao Instituto de Reorganização Agrária quando não seja este o cedente, no prazo de trinta dias e por carta registada com aviso de recepção.
4. Consideram-se inexistentes, sejam quais forem as datas em que tenham sido celebrados, todos os actos de contratos de subarrendamento e de cessão de direito ao arrendamento, excepcionados os casos previstos nos n.ºs 1 e 2 deste artigo.
5. Em todos os casos de actos e contratos declarados inexistentes no número antecedente, o sub-rendeiro que explore efectivamente a terra substituirá automaticamente o rendeiro nas condições estipuladas no respectivo arrendamento, que passará a valer como contrato de arrendamento directo entre o senhorio e sub-rendeiro, independentemente, mas sem prejuízo da assinatura de novo contrato, dentro do prazo de noventa dias a contar da entrada em vigor do presente diploma, o que constitui obrigação recíproca de um e outro.

C) Direitos de preferência

ARTIGO 25.º

(Preferência nas transmissões)

1. Na transmissão por acto entre vivos do direito de propriedade sobre prédio arrendado ou de quota ideal de prédio indiviso arrendado têm preferência, por ordem de menção, o rendeiro cultivador directo, as cooperativas de produção de pequenos agricultores e trabalhadores rurais existentes no concelho onde o prédio se situe, e o Instituto de Reorganização Agrária, seguindo-se os demais titulares de direitos de preferência previstos na lei geral. Esta regra cede, contudo, em face do direito de preferência do co-herdeiro e do comproprietário.
2. O proprietário ou comproprietário deverão comunicar a todos os preferentes o preço e demais condições de transmissão do prédio, tendo estes, neste caso, um prazo máximo de trinta dias para exercerem o seu direito.
3. A falta de cumprimento do disposto no número anterior é fundamento para o exercício do direito de acção de preferência, a qual corre perante a comissão arbitrai e deve ser requerida no prazo de três meses a contar da data em que o requerente teve conhecimento dos elementos essenciais da transmissão.
4. Além do disposto no número antecedente o proprietário ou comproprietário ficam obrigados a indemnizar o comprador substituído pelos prejuízos sofridos.
5. No caso de existir mais do que uma cooperativa de produção de pequenos agricultores e trabalhadores rurais, no concelho onde se situa o prédio ou mais do que um rendeiro, a comissão arbitral deferirá o direito de preferência à cooperativa ou ao rendeiro que melhor assegure a reestruturação das explorações, com audição prévia do Instituto de Reorganização Agrária. A decisão deverá ser proferida no prazo de sessenta dias a contar do pedido de qualquer dos titulares do direito de preferência, ou do proprietário ou comproprietário que mostrem ter feito a comunicação referida no n.° 2. Se o não for, o direito considera-se legalmente deferido da cooperativa ou do rendeiro mais antigos para os mais modernos, de entre os que declarem desejar exercê-lo.
6. Quando o exercício do direito de preferência for requerido pelo Instituto de Reorganização Agrária, por cooperativas de produção de pequenos agricultores e trabalhadores rurais ou pelo rendeiro, o preço a pagar pelo preferente será o correspondente ao justo valor do prédio, ainda que inferior àquele por que tenha sido efectuada a alienação, se for esse o caso, não havendo lugar a depósito preliminar.
7. A determinação do justo valor do prédio será levada a efeito pela comissão arbitrai, a requerimento de qualquer dos interessados, ou constituirá incidente do processo em que for reconhecida a preferência, nos termos dos artigos 31.° e 33.°, conforme haja ou não recurso a juízo.
8. Dos instrumentos notariais relativos a transmissões por actos entre vivos do direito de propriedade ou de quotas ideais sobre prédios rústicos constará sempre, sob pena de falsas declarações, se o prédio ou prédios a que respeita estão ou não arrendados e, em caso afirmativo, quem é o rendeiro.
9. Os notários deverão exigir a declaração a que se refere o número anterior e advertir as partes da punição em que incorrem se a mesma não for verdadeira.
10. Incumbe ainda aos notários remeter ao Instituto de Reorganização Agrária, até ao dia 8 de cada mês, cópia ou fotocópia dos instrumentos outorgados no mês anterior, quando respeitarem a transmissões de prédios arrendados ou de direitos sobre eles.
11. O Instituto de Reorganização Agrária e as cooperativas de produção de pequenos agricultores e trabalhadores rurais ficam isentos de sisa, bem como dos impostos e das custas judiciais em todos os processos em que exercerem o direito de preferência.

ARTIGO 26.º

(Preferência no arrendamento)

1. O Instituto de Reorganização Agrária, em primeiro lugar, e as cooperativas de produção de pequenos agricultores e trabalhadores rurais do concelho onde se situa o prédio, em segundo lugar, gozam sempre do direito de preferência no arrendamento de prédios rústicos, relativamente aos quais se tenha produzido denúncia ou resolução dos contratos.
2. Ao exercício do direito de preferência previsto no número antecedente são aplicáveis, com as necessárias adaptações, as regras e a tramitação previstas no artigo 25.°.

VI - COMISSÕES ARBITRAIS

ARTIGO 27.°

(Composição)

1. As questões relativas ao arrendamento, incluindo a fixação e revisão do valor da renda e a matéria prevista no Decreto-Lei n.° 547/74, de 22 de Outubro, bem como a impugnação dos actos do Instituto de Reorganização Agrária praticados ao abrigo deste diploma, serão julgadas por comissões arbitrais cujas áreas de jurisdição correspondem às das comarcas existentes.
2. As comissões arbitrais são presididas pelo juiz de direito da comarca e delas fazem parte: um técnico agrário - diplomado com os cursos de engenheiro agrónomo ou silvicultor, de regente agrícola ou florestal ou de médico veterinário - designado pelo Secretário de Estado da Agricultura, sob proposta do Instituto de Reorganização Agrária, um representante dos rendeiros, um representante dos senhorios e um representante dos trabalhadores rurais.
3. Os representantes dos rendeiros, dos senhorios e dos trabalhadores rurais, a que se refere o número anterior, são designados pelas respectivas associações existentes na área de jurisdição da comissão arbitral ou, na falta dessas associações ou dessa designação, eleitos em assembleia de cada uma das respectivas classes expressamente convocadas pelo Instituto de Reorganização Agrária para esse fim.
4. Quando se designarem os representantes da Secretaria de Estado da Agricultura, dos rendeiros, dos senhorios e dos trabalhadores rurais, designar-se-ão também os respectivos substitutos.
5. O Instituto de Reorganização Agrária promoverá a regulamentação do funcionamento das comissões arbitrais, o formalismo da designação e posse dos respectivos membros, a duração do seu mandato, a publicidade da respectiva constituição e o mais necessário ao seu funcionamento expedito e eficaz.

ARTIGO 28.º 

(Atribuições)

1. Ao presidente compete a direcção, orientação e preparação do processo para julgamento e julgar de direito e relatar a decisão final, salvo o disposto no artigo 32.°.
2. Aos restantes membros compete contribuir, através dos seus conhecimentos especializados da vida prática e do senso popular, para a recolha, selecção e fixação da matéria de facto, intervir na fase da produção da prova e da discussão e julgamento, ficando exclusivamente a seu cargo a decisão, em primeira instância da matéria de facto, salvo o disposto no artigo 32.°.
3. O técnico agrário representante da Secretaria de Estado da Agricultura terá, sempre que necessário, voto de desempate na decisão da matéria de facto.

ARTIGO 29.º

(Prazo de impugnação)

Os actos do Instituto de Reorganização Agrária são impugnáveis nos termos gerais de direito.

ARTIGO 30.º

(Execução prévia)

Os actos e decisões do Instituto de Reorganização Agrária, cometidos e proferidos no uso da competência que lhe é atribuída pelo presente diploma, gozam do benefício da execução prévia.

A pedido de qualquer interessado, deve o Instituto de Reorganização Agrária emitir, dentro do prazo máximo de dez dias, certidão de teor dos seus actos e decisões, à qual pode facultativamente acrescentar os respectivos fundamentos.

ARTIGO 31.º

(Forma de processo: regras gerais)

As questões a que se refere o artigo 27.° seguem a forma sumária, independentemente do seu valor, com ressalva do disposto nos artigos seguintes.

ARTIGO 32.°

(Forma de processo: regras especiais)

1. Os procedimentos cautelares seguem o regime processual estabelecido no Código de Processo Civil, com as necessárias adaptações exigidas pela atribuição da competência para o seu julgamento às comissões arbitrais.
2. Quando as comissões arbitrais julgarem segundo a equidade, o processo comporta apenas o pedido do requerente e a resposta do requerido, bem como as diligências de prova que a respectiva comissão considere necessárias, cabendo à mesma, funcionando com todos os seus membros, a decisão final, relatada pelo presidente.

ARTIGO 33.º

(Funcionamento)

Os processos que seguirem a forma sumária, nos termos do artigo 31.°, seguirão também as regras do Código de Processo Civil, mas com observância das seguintes especialidades:

a) São dispensados a especificação e o questionário, devendo a prova incidir sobre todos os factos alegados;
b) É inadmissível em todos os casos a prova pericial por arbitramento;
c) Em princípio, haverá sempre lugar a inspecção judicial, a qual será realizada pela comissão arbitrai, lavrando-se auto em que se registem todos os elementos úteis para o exame e decisão da causa, podendo o presidente determinar que se tirem fotografias para serem juntas ao processo, sempre que isso seja proposto por qualquer dos membros da comissão ou requerido pelas partes;
d) A inspecção pode ter lugar em qualquer altura do processo, por uma ou mais vezes, sempre que se mostre de interesse para o esclarecimento da matéria de facto ou para a decisão da causa. É, porém, obrigatória, na fase da produção da prova;
e) A discussão e julgamento da causa são feitos com a intervenção da totalidade dos membros da comissão arbitral;
f) A decisão da matéria de facto é proferida sem intervenção do juiz de direito, ficando exclusivamente a cargo dos restantes membros da comissão arbitral, e exprime-se por acórdão lavrado pelo membro designado pela Secretaria de Estado da Agricultura;
g) A deliberação em que assentar o acórdão é tomada por maioria simples dos membros da comissão, ou dos respectivos substitutos, excluído o presidente, sendo obrigatória a justificação sumária dos votos de vencido;
h) Da decisão final é sempre admissível recurso para o tribunal da relação, independentemente do valor da causa.

VII - DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS 

ARTIGO 34.º

(Culturas de campanha)

1. Nos anos de 1975 e 1976 a Secretaria de Estado da Agricultura poderá autorizar formas transitórias de utilização da terra por períodos inferiores a um ano e com o objectivo de explorar culturas sazonais.
2. Estas formas de exploração da terra designam-se por culturas de campanha e ficam especialmente sujeitas às disposições dos artigos 35.°, 36.° e 37., aplicando-se-lhes o regime geral em tudo o que não for incompatível com as mesmas.

ARTIGO 35.º 

(Culturas de campanha: continuação)

1. A exploração da terra far-se-á mediante contratos escritos directamente celebrados entre os empresários das explorações e os cultivadores-companheiros.

2. A validade dos contratos fica condicionada a autorização do Instituto de Reorganização Agrária, devendo deles constar o respectivo prazo, o montante da renda, a identificação das partes, do prédio ou parcela do mesmo, respectiva área, culturas a efectuar e efectuadas nos dois anos imediatamente anteriores.
3. Os contratos já celebrados para produzirem efeitos no ano de 1975, incluindo os automaticamente renovados nos termos do Decreto-Lei n.° 699/74, de 6 de Dezembro, ficam igualmente sujeitos a forma escrita e aprovação do Instituto de Reorganização Agrária nos termos do número anterior.
4. O montante da renda máxima por hectare será determinado por portaria do Secretário de Estado da Agricultura.
5. O disposto no número anterior aplica-se aos contratos referidos no n.° 3, dando lugar à redução da renda se tiver sido estipulada por quantia superior ou à devolução do excedente se já tiver sido efectuado o seu pagamento.

ARTIGO 36.º

(Culturas de campanha: nulidades)

1. Os contratos relativos a culturas de campanha que não respeitem o disposto nos artigos precedentes deverão ser adaptados ao que neles se dispõe, dentro do prazo de noventa dias a contar da entrada em vigor deste diploma, por iniciativa de qualquer das partes, sob pena de serem considerados nulos e de nenhum efeito, podendo, neste caso, o Instituto de Reorganização Agrária tomar de arrendamento o prédio ou prédios objecto dos mesmos contratos, nos termos do artigo 22.°.
2. O Instituto de Reorganização Agrária poderá ceder a exploração dos prédios que tiver tomado de arrendamento, nos termos do n.° 1, em regime de campanha, de preferência a cooperativas de produção de pequenos agricultores e trabalhadores rurais.

ARTIGO 37.º

(Culturas de campanha: intervenção do Instituto de Reorganização Agrária)

Durante o período a que se refere o n.° 1 do artigo 35.° o Instituto de Reorganização Agrária tem o direito de tomar de arrendamento as terras utilizáveis em culturas de campanha, a fim de converter tal forma de exploração noutras económica e socialmente mais adequadas, seja através de cooperativas de produção de pequenos agricultores e trabalhadores rurais, seja por meio de sub-rendeiros.

ARTIGO 38.° 

(Arrendamentos florestais)

1. Os arrendamentos para fins de exploração florestal terão a duração que constar dos respectivos planos de utilização previamente aprovados pela Direcção-Geral dos Recursos Florestais.
2. Os contratos de arrendamento em vigor à data do presente diploma caducam no termo dos prazos em curso.

ARTIGO 39.º

(Arrendamentos em vigor à data do início da vigência deste diploma)

1. O presente diploma aplica-se aos arrendamentos em vigor à data do início da sua vigência, incluindo os automaticamente renovados nos termos do Decreto-Lei n.° 573/74, de 31 de Outubro, devendo os senhorios dar cumprimento ao disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 2.° do presente diploma até 31 de Dezembro de 1975.
2. Nos contratos reduzidos a escrito, por força do disposto no número anterior, mencionar-se-á expressamente a data do início do arrendamento.

ARTIGO 40.º

(Crime de especulação)

Constitui crime de especulação, punível nos termos da legislação respectiva:

a) A recusa de recibo de renda paga;
b) A cobrança antecipada de renda;
c) A exigência, pelo senhorio, de renda mais elevada do que a devida ou de qualquer outra quantia não autorizada pela lei ou, em termos regulares, pelo contrato.

ARTIGO 41.º

(Prazo de fixação das rendas em 1975)

No ano de 1975, o prazo a que se refere o n.° 3 do artigo 6.° termina no dia 31 de Julho.

ARTIGO 42.º

(Comissões arbitrais)

1. Enquanto não estiverem constituídas as comissões arbitrais a que se refere o artigo 27.°, as questões da sua competência serão resolvidas por uma comissão comarca com a seguinte composição:

a) O juiz da comarca que presidirá;
b) Um técnico agrário designado pelo Instituto de Reorganização Agrária;
c) Um representante de cada uma das partes no processo.

2. Até que sejam publicadas disposições sobre a orgânica dos serviços das comissões arbitrais, ficam os mesmos a cargo das secretarias judiciais das respectivas comarcas.

ARTIGO 43.°

(Processos pendentes)

1. Todos os processos pendentes em juízo ou de qualquer comissão arbitral e que respeitem a questões ou litígios entre senhorios e rendeiros e que ainda não tenham sido julgados em 1.ª instância transitarão para as comissões arbitrais a que se refere este diploma, salvo se já tiver começado a fase do julgamento.
2. No prosseguimento e julgamento dos processos a que se refere o número anterior seguir-se-ão as disposições deste decreto-lei.

ARTIGO 44.º

(Proibição de parceria agrícola)

1. Ficam proibidas todas e quaisquer formas de utilização da terra que tenham por base contrato segundo o qual uma pessoa dê ou entregue a outrem um ou mais prédios rústicos para serem cultivados ou explorados por quem os recebe, em troca de pagamento de uma quota-parte da respectiva produção ou da prestação de qualquer forma de trabalho.
2. Todos os actos referidos no número anterior serão obrigatoriamente convertidos em contratos de arrendamento, no prazo de noventa dias a contar da data da publicação deste diploma.
3. No caso de não cumprimento do disposto no número anterior, o senhorio não poderá exigir o pagamento da quota-parte da respectiva produção ou de qualquer outra prestação.

ARTIGO 45.°

(Direito subsidiário)

1. Nos casos omissos e em tudo o que não contrarie os princípios deste diploma aplicam-se as regras gerais dos contratos e as especiais da locação, em conformidade com as disposições do Código Civil.
2. O Secretário de Estado da Agricultura, por portaria, definirá os requisitos que serão tidos em conta para classificação dos prédios como incultos, subaproveitados ou inadequadamente explorados.

ARTIGO 46.º

(Disposições revogatórias)

1. Ficam revogados os artigos 1064.° a 1082.° do Código Civil e os Decretos-Leis n.° 653/74, de 22 de Novembro, e n.° 573/74, de 31 de Outubro, sem prejuízo da aplicação do seu regime no âmbito do Decreto-Lei n.° 699/74, de 6 de Dezembro, que se mantém em vigor.
2. Os n.ºs 2 a 4 do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 547/74, de 22 de Outubro, são revogados pelos artigos 27.° a 34.° e 43.° deste decreto-lei.

ARTIGO 47.º

(Congelamento de rendas)

Ficam congeladas as rendas dos arrendamentos rurais enquanto não estiverem fixados os seus valores máximos, nos termos do artigo 6.°, n.° 3, e do artigo 36.°, n.° 4, deste diploma.
ARTIGO 48.° 

Este diploma entrará em vigor quinze dias após a sua publicação.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros. - Fosco dos Santos Gonçalves - Francisco Salgado Zenha - Emílio Rui da Veiga Peixoto Vilar.

Promulgado em 2 de Abril de 1975. 

Publique-se. 

O Presidente da República - Francisco da Costa Gomes.